Zona de desenvolvimento sustentável incentivou desmatamento na fronteira entre os estados do Amazonas, Acre e Rondônia

O conceito de desenvolvimento sustentável procura conciliar a necessidade humana de expandir suas atividades econômicas e melhorar a qualidade de vida com a urgente demanda de preservar os recursos naturais que sustentam a vida no planeta. Entretanto, na Amazônia, o projeto de estabelecer uma Zona de Desenvolvimento Econômico Sustentável está tendo o efeito contrário, resultando no avanço da fronteira do desmatamento, especialmente a partir de 2018. Essa constatação é revelada por uma pesquisa realizada com a colaboração de professores da Unesp e publicada na revista Perspectives in Ecology and Conservation.

Fonto: Rodrigo de Oliveira Andrade

O projeto em foco é a Zona de Desenvolvimento Sustentável (ZDS) Abunã-Madeira, que abrange uma área de pouco mais de 454 mil km², incluindo 32 municípios situados na fronteira entre o sul do Amazonas, leste do Acre e noroeste de Rondônia, com uma população de aproximadamente 1,7 milhão de habitantes.

Iniciado em 2018 sob o nome de “Zona de Desenvolvimento Sustentável entre os estados do Acre, Amazonas e Rondônia (AMACRO)”, o projeto tem formalmente como objetivo promover a sustentabilidade ambiental através do desenvolvimento socioeconômico da região. No entanto, sua inspiração parece derivar da expansão da produção agrícola observada nas últimas duas décadas na região conhecida como MATOPIBA, abrangendo Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, originalmente coberta pelo Cerrado. Em 2021, o projeto foi oficialmente apresentado pelos três estados e pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro sob o nome de ZDS Abunã-Madeira.

O conceito de desenvolvimento sustentável busca conciliar a demanda humana por crescimento econômico e melhoria da qualidade de vida com a necessidade urgente de preservar os recursos naturais que sustentam a vida no planeta. Entretanto, na Amazônia, o projeto de criação de uma zona de desenvolvimento econômico sustentável está tendo o efeito contrário, resultando no avanço da fronteira do desmatamento, especialmente a partir de 2018, como revelado por uma pesquisa em colaboração com docentes da Unesp, publicada na revista Perspectives in Ecology and Conservation.

Fonte: “AMACRO: the newer Amazonia deforestation hotspot and a potential setback for Brazilian agriculture”

O projeto em questão é a Zona de Desenvolvimento Sustentável (ZDS) Abunã-Madeira. Abrangendo uma área de pouco mais de 454 mil km², ela engloba 32 municípios situados na fronteira entre o sul do Amazonas, o leste do Acre e o noroeste de Rondônia, com uma população de cerca de 1,7 milhão de pessoas.

Iniciado em 2018 sob o nome de “Zona de Desenvolvimento Sustentável entre os estados do Acre, Amazonas e Rondônia (AMACRO)”, formalmente, o objetivo do projeto de zoneamento é promover a sustentabilidade ambiental através do desenvolvimento socioeconômico da região. Entretanto, sua inspiração parece derivar da explosão da produção agrícola observada nas últimas duas décadas na região conhecida como MATOPIBA, abrangendo Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, originalmente coberta pelo Cerrado. Em 2021, o projeto de zoneamento foi formalmente apresentado pelos três estados e pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro com o nome de ZDS Abunã-Madeira.

Durante as discussões e esforços para a criação da AMACRO, os políticos e governadores dos três estados amazônicos sustentaram a ideia de que a vocação econômica natural da região seria o agronegócio. Argumentavam que o projeto de zoneamento proporcionaria facilidades para atrair investimentos nesse setor. Alegavam que isso resultaria na geração de empregos e na resolução das demandas das populações locais, especialmente considerando que 43% dos municípios da AMACRO apresentam baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Especificamente, o estado do Amazonas buscava financiamento para potencializar municípios com potencial agrícola na região sul. O Acre almejava explorar corredores de transporte para exportação ao longo das rodovias BR-317, que conecta o Brasil ao oceano Pacífico através do Peru, e BR-364, ligando o estado ao resto do país. Enquanto isso, Rondônia buscava fortalecer suas cadeias produtivas. Todos compartilhavam o objetivo de explorar os mercados asiáticos por meio de rotas oceânicas e portos no Pacífico.

Altas temperaturas sobre as árvores da Amazônia

Entretanto, segundo Chaves, o projeto foi lançado sem a realização de estudos para avaliar seus impactos ambientais e sobre as comunidades tradicionais. Ele ressalta que a região abriga 86 unidades de conservação, 49 áreas de terras indígenas e quase 95 mil km² de florestas públicas não destinadas. Isso significa que são terras sob domínio do governo federal ou estadual que ainda não receberam uma destinação específica, como reserva indígena, unidade de conservação ou outro tipo de área protegida, como reservas extrativistas, assentamentos ou áreas quilombolas. “Algumas dessas áreas de terras públicas podem ser mais facilmente alteradas se fizerem parte de iniciativas como as zonas de desenvolvimento sustentável”, explica ele.

Análises de dados de sensoriamento remoto realizadas pela equipe de Chaves revelam que os municípios que compõem a ZDS Abunã-Madeira foram responsáveis por 76,5% da taxa total de desmatamento registrada nos estados do Amazonas, Acre e Rondônia entre os anos de 2018 e 2022. Apenas no ano de 2021, 64% do desmatamento nessa área ocorreu em terras públicas. “Os conflitos fundiários e a violência contra povos indígenas também aumentaram consideravelmente naquela região, impulsionados pela falta de fiscalização e pelo estímulo ao modelo de desenvolvimento baseado na expansão de áreas para a atividade agropecuária”, afirma.

Apesar do aumento significativo observado a partir de 2018, o desmatamento nessa região tem aumentado desde 2012, coincidindo com um período de crise econômica, mudanças nas forças políticas e enfraquecimento da regulamentação ambiental no Brasil. De 2012 a 2020, 5,23% da área da ZDS Abunã-Madeira foi convertida de florestas para áreas de uso humano, principalmente como pastagens, conforme dados do MapBiomas, uma iniciativa da ONG Observatório do Clima que envolve universidades, empresas de tecnologia e organizações da sociedade civil brasileira.

Fonte: “AMACRO: the newer Amazonia deforestation hotspot and a potential setback for Brazilian agriculture”

Estudos recentes indicam que a conversão do uso da terra na região está principalmente associada à grilagem de terras, exploração madeireira e queimadas, fatores que resultam na degradação florestal, desmatamento e expansão do arco de desmatamento para áreas florestais preservadas.

Ao cruzar dados de desmatamento do Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica por Satélite (Prodes), coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com informações do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) sobre posse de terra entre 2012 e 2022, os autores do estudo observaram um aumento alarmante no desmatamento em todos os tipos de classes fundiárias, especialmente nas unidades de conservação, desde 2018, quando a ideia de projeto da ZDS Abunã-Madeira ganhou destaque.

Nas áreas de assentamentos rurais, foi registrada uma taxa significativa, 83,3% acima da média entre 2012 e 2020. Nas fazendas privadas, áreas militares e terras não designadas, as maiores taxas foram observadas no período de 2018 a 2022. Esse padrão também foi identificado nas unidades de conservação. Nas áreas de terras indígenas, o desmatamento aumentou a partir de 2018, com todas as taxas ultrapassando 20 km². “O desmatamento tem sido mais frequente e crescente em terras privadas, mas também avança de forma preocupante nas unidades de conservação”, afirma Chaves.

A conversão desenfreada de florestas em pastagens ou terras agrícolas na Amazônia contribui para o aumento das temperaturas e alterações nos padrões de chuvas, intensificando a ocorrência de eventos climáticos extremos. Segundo Marcos Adami, pesquisador do INPE, em São José dos Campos, interior de São Paulo, e um dos autores do artigo, “essas condições perturbam a regulação climática e o ciclo da água, prejudicando a produção agrícola em estados relevantes, como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, entre outros, resultando em perdas bilionárias”.

Amazônia pode atingir ponto de não retorno até 2050 | Florestal Brasil

A Amazônia já sofreu uma perda de aproximadamente 18% de sua cobertura florestal. Se essa tendência persistir nos próximos 25 anos, o bioma corre o risco de atingir um ponto crítico de não retorno, o que significaria um colapso parcial ou total da floresta e uma aceleração do aquecimento global. Este alerta foi destacado em um estudo publicado em 14 de fevereiro na revista Nature por um grupo internacional de 24 pesquisadores, dos quais 14 são brasileiros, incluindo o climatologista José Marengo, professor do Programa de Pós-graduação em Desastres Naturais da Unesp e do CEMADEN.

No caso específico da região da AMACRO, apenas em 2022, o desmatamento atingiu quase 430 mil hectares, e estima-se que até aquele ano cerca de 30% da área original de floresta já havia sido destruída. Segundo Adami, a quantidade de terras já desmatadas seria suficiente para atender às necessidades de produção agropecuária, tornando desnecessária a expansão do desmatamento. “Na verdade, o que está acontecendo lá não está tanto relacionado à expansão da área para produção agrícola, mas sim à especulação fundiária”, ele afirma. Explica-se que essa prática é antiga no Brasil, mas ganhou força nos últimos anos, “impulsionada por um modelo de desenvolvimento que utiliza o desmatamento para especulação imobiliária e o aumento de áreas para a agricultura e a pecuária extensiva, em vez de maximizar a produção em áreas já desmatadas”.

Para Chaves, a reversão do avanço do desmatamento na região requer a implementação de medidas tanto em nível subnacional, nacional quanto internacional, visando coibir práticas ilegais e priorizar a sustentabilidade. “O país possui tecnologia e sistemas para avaliar os impactos ambientais e promover políticas públicas de planejamento territorial, como os programas satélites CBERS e Amazônia-1. Além disso, existem iniciativas, inclusive locais, capazes de gerar benefícios econômicos através da diversificação da produção e da agregação de valor às culturas nativas, valorizando assim a preservação da floresta”, ele destaca. A maior dificuldade, na sua opinião, é alterar a percepção dos políticos e da população local, muitos dos quais já adotaram a ideia de que a combinação de criação de gado e cultivo de soja é a melhor opção para promover o desenvolvimento econômico na região.

Fonte: Jornal da Unesp

Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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