Cientistas fazem redescoberta de árvore extinta em Pernambuco, onde encontraram quatro exemplares do azevinho pernambucano em uma plantação de cana-de-açúcar no estado. A espécie, conhecida cientificamente como Ilex sapiiformis, foi inicialmente documentada pelo botânico escocês George Gardner em 1838 e redescoberta em março deste ano em Igarassu, próxima a Recife.
A engenheira agrônoma e especialista em botânica Juliana Alencar, juntamente com o professor Milton Groppo Júnior da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, participou da equipe liderada pelo pesquisador Gustavo Martinelli do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro. A espécie estava entre as mais procuradas por organizações de conservação ambiental.
Juliana Alencar relata que, até então, acreditava-se que a espécie estava extinta ou em vias de extinção. As expedições em Pernambuco fazem parte de um projeto da organização conservacionista Re:wild, reconhecida pela participação do ator americano Leonardo DiCaprio. O projeto global visa encontrar espécies que não são vistas há muito tempo pelos cientistas, e atualmente lista as 25 espécies “perdidas” mais procuradas.
Recrutada para a pesquisa, Juliana Alencar conta que Martinelli a apresentou ao diário de viagem de Gardner, que chegou ao Brasil em 1836. Ela aceitou o desafio, encantada com a ideia de sair a campo, algo que os botânicos adoram fazer.
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A equipe utilizou os relatos do diário de Gardner como um guia, uma espécie de caça ao tesouro, para encontrar a planta. A descrição feita no século 19 foi fundamental para a redescoberta, apesar dos desafios históricos, como nomes de lugares diferentes dos atuais. A colaboração com historiadores em Recife foi crucial para associar os nomes antigos aos atuais, facilitando a localização.
A pesquisa avançou para uma fase de aprofundamento nos acervos herbários brasileiros e mundiais, visando a comparação e análise das características da planta com registros digitais. No entanto, os bancos digitais não continham informações cruciais de localização e imagens, especialmente no caso do azevinho pernambucano, uma espécie tão pouco conhecida que não possuía sequer um nome popular registrado na literatura, dificultando as buscas, conforme destaca o professor Groppo.
Os pesquisadores também identificaram uma classificação incorreta da família botânica à qual a planta pertencia. Duas coletas, armazenadas em herbários distintos, se destacaram durante as investigações. A primeira, datada de 1962, foi encontrada nos arquivos do Herbário do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), enquanto a segunda, de 2007, faz parte do acervo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ambas apresentavam semelhanças com a planta procurada, segundo Juliana.
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O próximo passo consistiu em verificar as amostras do herbário mantido pelo laboratório do professor Groppo no campus da USP em Ribeirão Preto. Groppo é especialista na família botânica Aquifoliaceae, à qual o Ilex sapiiformis pertence, e as comparações indicaram a possibilidade de ser a espécie procurada. Após análises, concluíram que, ao contrário da amostra dos anos 1960, a coleta da UFPE era bem descritiva, fornecendo informações precisas sobre a localização e as coordenadas do achado dos botânicos da época. Diante disso, a expedição foi direcionada, e toda a equipe foi a campo em busca de novos exemplares.
O Jardim Botânico de Pernambuco desempenha um papel crucial como parceiro na pesquisa, assumindo a responsabilidade vital na próxima fase dos estudos, que envolve a preservação e multiplicação dos exemplares do azevinho pernambucano recentemente encontrados. No entanto, Juliana reconhece que ainda há lacunas nos dados disponíveis sobre a espécie. Atualmente, a equipe está visitando o local onde a planta foi descoberta, buscando coletar sementes das árvores. A pesquisadora destaca a complexidade desse processo, ressaltando a falta de informações sobre a fenologia da espécie, como os períodos de floração e frutificação.
Apesar dos desafios, a redescoberta do azevinho pernambucano assume uma importância extraordinária, especialmente considerando que ocorreu em uma região já profundamente urbanizada. O cenário local é caracterizado por poucos fragmentos de mata, muitos dos quais já degradados, em uma área cuja ocupação remonta ao século 16, no início da colonização do Brasil pelos europeus na Região Nordeste, conforme contextualiza Groppo.
O desfecho da expedição ressalta a urgência de preservar os remanescentes da Mata Atlântica, mesmo em áreas próximas às zonas urbanas. Esta ação é justificada pela maior vulnerabilidade e risco enfrentados por espécies com distribuição geográfica restrita, como o azevinho pernambucano.
No retorno da equipe ao local, em agosto, foi observada a morte de uma das árvores anteriormente encontradas. O professor destaca a necessidade de ações para conservar pelo menos esses indivíduos e proporcionar condições favoráveis para sua reprodução. A principal preocupação da pesquisa agora é manter a espécie viva, preservando-a para garantir sua continuidade em maior número, conclui Juliana Alencar.
Fonte: Jornal da USP
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