A 19ª Conferência da Cites decidiu que as exportações das madeiras de ipê e cumaru precisam de alvarás atestando que foram extraídas legalmente.
O setor madeireiro, um dos mais destacados nas exportações do Pará ano passado, vai enfrentar um grande desafio este ano com a recente inclusão das espécies cumaru e ipê no Anexo II da Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites), voltado a espécies que podem entrar em extinção caso sigam como alvos de exploração excessiva.
Em novembro do ano passado, a 19ª Conferência da Cites decidiu que as exportações de madeira das duas árvores precisam de alvarás atestando que foram extraídas legalmente. Na ocasião, a medida foi assinada por 184 países com o prazo de 90 dias para começar a valer, ou seja, a partir de março de 2023.
Na avaliação de Deryck Martins, diretor técnico da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeiras do Estado do Pará (Aimex), essas duas espécies são de suma importância para a produção madeireira no Estado, e essa inclusão na Cites vai impactar na exportação de madeira, “uma vez que exigirá mais uma licença dentro de um processo que já é extremamente burocrático, elevando os custos das transações comerciais”.
“Essa decisão sugere um desafio a mais para a produção madeireira na Amazônia, pois o ipê é, hoje, uma das principais espécies trabalhadas na região. Então, isso poderá impactar toda a cadeia produtiva. Além disso, a partir da inclusão, será fundamental que o próprio governo fortaleça os órgãos ambientais que serão responsáveis por esse processo, capacitando os servidores do Ibama, por exemplo, para esse novo processo. Ressalta-se ainda que essas exigências serão somente para a exportação e não ocorrerão para o mercado doméstico”, declara Deryck.
Murilo Araújo, diretor da Unifloresta e advogado especialista em direito ambiental também aponta os impactos negativos que a inclusão resultará no setor. “Toda a cadeia produtiva será impactada. Agora, com a inclusão no Cites, todo nosso trabalho deve perder valor no mercado por conta da demora para liberação das madeiras, pois quando a mercadoria chega nos portos para ser exportada e vendida, os órgãos não têm condição de ter a mesma agilidade que nós temos com licenciamento. A perda econômica será grande”, afirma o empresário.
“Quanto se fala em proteger as espécies, isso é super positivo para todos, inclusive para o setor, pois isso significa que os critérios serão mais rígidos. Quem trabalha com madeira legal, não reclama, pois seguindo às normas, as madeiras podem continuar sendo extraídas e comercializadas. Mas precisamos que o governo também se adeque. Hoje é preciso de 15 a 20 dias para que documentos e madeiras sejam analisados. Para as espécies que estão no Cites, esse prazo sobe para 40 dias, o que inviabiliza nosso mercado”, aponta Murilo.
O diretor executivo da Confloresta, Daniel Bentes, afirma que reconhece a importância da Cifes, mas cita duas questões problemáticas para o setor. “A entrada nos anexos da Cites limita a comercialização internacional apenas para madeira oriunda de manejo florestal, que possui técnicas que garantem a sustentabilidade da produção florestal, cuja comprovação é regulada a partir de autorização de exportação do órgão ambiental competente. Apesar deste aspecto positivo, há preocupação do setor com duas situações”, explica.
“Como o mercado internacional irá se comportar com a entrada na Cites? Alguns compradores podem descontinuar a negociação por entender que a espécie está sob risco de extinção, ainda que o produto tenha garantia de origem. Outro ponto é que a capacidade de análise da equipe do órgão ambiental está restrita, havendo necessidade de reposição no quadro de servidores, uma vez que, na condição atual, a definição de maior rigor técnico pode ocasionar maior tempo de espera no trâmite de exportação, gerando mais custos às empresas”
Daniel defende que a melhora da capacidade dos órgãos reguladores é fundamental para dar segurança ao mercado internacional. “Do contrário, é possível que a madeira dessas espécies perca espaço para materiais concorrentes, como plásticos, cerâmicas e metais. Caso o mercado de exportações dessas espécies seja descontinuado, um dos efeitos mais significativos será nos contratos de concessão do Serviço Florestal Brasileiro, que podem vir a ser rescindidos por perda de viabilidade econômica, tornando as florestas públicas destes contratos suscetíveis às ações de atividades ilegais”, argumenta.
A comercialização de ipês sustentam financeiramente várias concessões federais e estaduais na Amazônia, e a inclusão da espécie no Cites, com a Cumaru, ocorre em um momento em que o setor madeireiro deu sinais de alavancagem, tendo respondido ano passado, em valores, por US$ 351,190 milhões em exportações, dentro do volume total de US$ 21,47 bilhões das exportações paraenses no período, registrando um crescimento de 76,18%, tendo os Estados Unidos como principal destino da madeira do Pará.
Estudos
A principal reclamação dos empresários é pela suposta falta de dados científicos para a inclusão das espécies na lista de perigo de extinção. A reportagem do O Liberal solicitou informações ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), responsável pela regulamentação da Cifes, sobre as razões das últimas decisões tomadas. Até a publicação desta matéria, não tivemos retorno do pedido.
“É extremamente necessário que tenhamos parâmetros técnicos para mudanças como essas, que afetam não só uma atividade econômica, mas toda uma cadeia produtiva e social. Infelizmente, não foi isso o que ocorreu com essa decisão, sendo muito mais política e econômica do que técnica. Hoje, por exemplo, não temos dados que justifiquem a inclusão das duas espécies no anexo II da Cites, não é possível afirmar que elas correm riscos de extinção na Amazônia”, expõe Derick Martins.
Os diretores da Aimex e Unifloresta afirmam que a decisão do Ibama vem em discordância, inclusive com estudos realizados pela Embrapa Amazônia Oriental sobre o manejo florestal do ipê, demonstrando que a técnica garante a regeneração natural da espécie, sem prejuízos para o ciclo de corte.
A pesquisa da Embrapa do Pará foi realizada no ano passado em áreas de manejo da empresa Amazônia Florestal, em Itaituba. Os resultados apontaram o baixo risco de extinção da espécie em locais onde a exploração florestal é feita dentro da lei e a possibilidade de se investir nessa árvore, que tem alta durabilidade e alto valor no mercado.
“Se a decisão estiver de acordo com a ciência, não tem problema nenhum. Mas neste caso, não teve base científica alguma. Por isso, o setor florestal está buscando uma forma de impugnar a medida. Repito,quanto maior a fiscalização, melhor, pois valoriza quem trabalha com madeira legal. Mas o problema é que o Ibama pelo visto não entende de produção sustentável que é o manejo florestal”, finalizou Murilo Araújo.
A Cites
Cites é a Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites), assinada pelo Brasil em 1975, para regular de forma eficaz o comércio de espécies da fauna e flora, prevenindo-as do perigo de extinção, quando a ameaça for o comércio internacional. Para tanto, atribui aos países produtores e consumidores sua parte na responsabilidade comum e estabelece mecanismos necessários para garantir a exploração não prejudicial das populações.
Com base nos procedimentos propostos pela Convenção, o governo brasileiro – por meio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), incorporou em seus procedimentos para a avaliação e emissão de Licenças de exportação/importação, protegendo atualmente cerca de 5.950 espécies de animais e 32.800 espécies de plantas de todo o mundo.
Fonte: O Liberal
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