A raiz do mal: Pinus se alimentam de árvores mortas

Recentemente, uma nova descoberta revelou a notável capacidade de adaptação das plantas: sua habilidade de colonizar troncos de árvores mortas para obter nutrientes, um fenômeno apelidado de “fitocanibalismo”. Esse processo atua como um atalho no ciclo biogeoquímico de nutrientes em sistemas florestais, facilitando a recirculação dos elementos no ambiente.

a raiz do mal
As raízes das árvores adjacentes colonizaram a região entre o lenho e a casca da árvore morta, formando um manto de raízes que também cresceram na parte interna da casca. Fotos: Rangel Consalter/Acervo

O achado ocorreu em uma plantação de pínus (Pinus herrerae) em Jaguariaíva, no Nordeste do Paraná, e foi detalhadamente descrito e publicado no periódico científico Forest Systems.

Nos ecossistemas florestais, as folhas das árvores caem sobre o solo, formando uma camada conhecida como serapilheira (ou serrapilheira) — um estrato de matéria orgânica composta por resíduos vegetais e animais que se acumula na superfície do solo.

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Embora seja comum que as raízes das árvores colonizem a serapilheira em busca de nutrientes, elas também demonstram uma notável versatilidade. Essas raízes podem penetrar fendas em rochas, crescer em solos arenosos, expandir-se lateralmente para explorar o entorno e até invadir sistemas de esgoto em ambientes urbanos, em busca de água e nutrientes. Esse comportamento resiliente permite que as plantas sobrevivam em condições improváveis.

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Fotos: Rangel Consalter/Acervo

As florestas, com suas árvores crescendo lado a lado, desempenham um papel crucial ao reduzir a ação dos ventos, permitindo que mesmo árvores mortas permaneçam de pé por muitos anos antes de eventualmente cair devido ao apodrecimento da base.

Nesse contexto, pesquisadores da Pós-graduação em Ciências do Solo da Universidade Federal do Paraná (UFPR) identificaram uma nova habilidade nas raízes de pinheiros, denominada “fitocanibalismo”.

O professor Antonio Carlos Motta, orientador da pesquisa, explicou que na floresta de pinheiros estudada, algumas árvores morreram devido à baixa fertilidade do solo, tornando-as mais vulneráveis a pragas e doenças. Essas árvores apresentavam pequenas rachaduras na base, o que, ao longo do tempo, resultou no desprendimento da casca do lenho, criando um espaço entre eles. As raízes na serapilheira aproveitaram essas rachaduras na base da planta para se infiltrar e expandir entre o lenho e a casca, colonizando esse espaço. Antes mesmo de a árvore cair no solo, as raízes ao redor já começavam a explorar os nutrientes das árvores mortas. Essa observação ressalta a incrível capacidade de adaptação das plantas em face das condições adversas do ambiente.

As raízes que colonizaram as árvores mortas demonstraram um crescimento notável, estendendo-se por metros acima da superfície do solo. Ao invadir esse espaço, formaram um emaranhado que envolveu o tronco morto, mantendo-o de pé.

A análise química dos troncos e cascas das árvores mortas revelou que as raízes das árvores vivas se beneficiam dos nutrientes liberados pelos tecidos em decomposição. Dada a escassez natural de nutrientes nos solos da região, as raízes de pinheiros exploram cada oportunidade para obter nutrientes, conforme descrito por Julierme Zimmer Barbosa, estudante de doutorado na época da descoberta e um dos autores da publicação.

O estudo relata que, após oito anos e meio da morte das árvores vizinhas, as raízes das plantas adjacentes atingiram mais de três metros acima da superfície da serapilheira. Esse crescimento contra a gravidade é considerado uma vantagem adaptativa, uma vez que a camada superficial é rica em nutrientes devido à decomposição e mineralização de resíduos orgânicos.

Barbosa destaca que a capacidade extraordinária de crescimento das raízes de pinheiros em busca de nutrientes vai além do conhecimento anterior, indicando uma eficiência notável na utilização de nutrientes em sistemas florestais com essa espécie.

Para os pesquisadores, esse estudo amplia a compreensão sobre a habilidade de crescimento radicular do pinheiro em ambientes sem solo, abrindo novas perspectivas de pesquisa sobre a ciclagem de nutrientes em ecossistemas florestais. Futuros estudos poderão explorar como as variações no sítio florestal afetam o “fitocanibalismo” no pinheiro e se outras espécies também apresentam essa notável capacidade.

Artigo:Pine root exploration of standing dead tree trunks: a short-cut biocycling process“, publicado no periódico Forest Systems.

Fonte: Ciência UFPR

Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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