Retrocesso ambiental: derrubada de vetos expõe 297 terras indígenas a novas ameaças

A Funai alerta que a medida fragiliza a proteção territorial e coloca 297 terras indígenas — ainda em processo de demarcação — sob risco imediato de impactos sem consulta ou avaliação técnica adequada

A decisão do Congresso Nacional de derrubar 56 dos 63 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Lei Geral do Licenciamento Ambiental (Lei nº 15.190/2025) provocou reação imediata da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e de entidades socioambientais. A votação, realizada na última quinta-feira (27), altera pontos centrais das regras de licenciamento e, segundo especialistas, abre brechas para que obras de médio porte sejam liberadas com menos análise técnica e menor participação de comunidades diretamente afetadas.

Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo

A Funai classificou o resultado como um ataque direto ao sistema de proteção territorial. O órgão afirma que a decisão compromete sua atuação em processos de licenciamento que envolvem terras indígenas ainda não homologadas — etapa considerada a mais frágil da demarcação e que representa cerca de 40% de todas as terras reconhecidas no país. Na prática, 297 territórios passam a correr risco imediato, podendo ser impactados por estradas, linhas de transmissão, projetos de infraestrutura e atividades potencialmente poluidoras sem consulta prévia às comunidades ou avaliações técnicas adequadas.

Para a autarquia, a exclusão de sua participação viola direitos constitucionais e “esvazia o papel institucional do Estado”, justamente no momento em que esses territórios mais dependem de acompanhamento para evitar invasões, desmatamento e pressões econômicas ilegais.

A reação de pesquisadores e ambientalistas reforça o alerta. Instituições como o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) consideram o movimento do Congresso um “retrocesso profundo”, especialmente por ocorrer poucos dias após a COP30, quando o Brasil reforçou compromissos de governança climática e redução de impactos ambientais. Para essas organizações, as mudanças abrem margem para licenciamento automático ou excessivamente simplificado, enfraquecendo etapas essenciais como estudos de impacto, audiências públicas e pareceres técnicos especializados.

O temor é que a desburocratização proposta pelo Legislativo acelere a expansão de obras sobre áreas sensíveis, aumente conflitos socioambientais e agrave a degradação de biomas já pressionados pelo avanço do desmatamento.

Dentro do governo, ainda que houvesse reconhecimento de que o sistema de licenciamento precisava de ajustes, a avaliação é de que o texto final aprovado pelo Congresso foi além do necessário e eliminou salvaguardas que, historicamente, evitaram danos irreversíveis às comunidades tradicionais e ao meio ambiente.

O cenário que se desenha após a derrubada dos vetos é de incerteza. Povos indígenas e comunidades tradicionais ficam mais expostos, enquanto órgãos técnicos perdem instrumentos de intervenção justamente nas etapas que antecedem grandes transformações territoriais. Ecologistas alertam que os efeitos podem ser duradouros, comprometendo biodiversidade, segurança hídrica e estabilidade climática.

Para a Funai e para a sociedade civil, a mensagem enviada pelo Congresso é clara: a proteção das terras indígenas perde força num momento em que esses territórios seguem entre os mais ameaçados do país. O impacto, dizem especialistas, será sentido tanto na vida das comunidades quanto no futuro ambiental do Brasil.


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