Entre 2013 e 2019, o equivalente a 32 milhões de hectares de florestas tropicais foram desmatadas ilegalmente para produção de itens como soja, carne bovina e óleo de palma. Brasil é um dos líderes no ranking
Mais de dois terços das florestas tropicais do mundo exploradas pelo agronegócio entre 2013 e 2019 foram devastadas de forma ilegal para a produção de itens como carne bovina, soja e óleo de palma. Os dados são de um estudo divulgado nesta terça-feira (18) pela Forest Trends. Com o título de “Colheita ilícita, bens coniventes”, o relatório revela como a produção da agricultura comercial foi o motor de 60% de toda área florestal perdida no planeta, o equivalente a 46,1 milhões de hectares, da qual 69% dela foi desmatada de forma ilegal, o que corresponde a 32 milhões de hectares – uma área maior que o estado de São Paulo. A maior parte do desmatamento ilegal identificado no estudo ocorreu em dois países: Brasil e Indonésia.
Um estudo confirma o mesmo resultado do Fleischatlas 2021 (“Atlas da carne 2021”), apresentado no inicio de 2021 em Berlim e que foi divulgado aqui no Florestal Brasil em Janeiro.
O estudo destaca ainda que 31% dessa área de floresta explorada pelo agronegócio no mundo – legal ou não – foi exportada para outros países, bem distantes das áreas de florestas tropicais devastadas, como Estados Unidos, China, Reino Unido e países da União Europeia. Um dos objetivos do relatório é justamente revelar até que ponto os itens agrícolas produzidos na América Latina, Sudeste da Ásia e África e exportados para todo o mundo estão relacionados à destruição ilegal de florestas. O Brasil, por exemplo, é visto como um país de alto risco de exposição ao desmatamento ilegal, pois em 2019 no mínimo 95% do desmatamento foi feito de forma criminosa.
Por ano, as produções do agronegócio, com destaque para carne bovina, cacau, soja e óleo de palma, derrubam 4,5 milhões de hectares de florestas tropicais de forma ilícita, o que corresponde a uma área maior que o estado do Rio de Janeiro desmatada de forma ilegal anualmente. Esta derrubada é responsável ainda pela liberação de 2,7 gigatoneladas de emissões de carbono por ano e um dos principais fatores de liberação de gases de efeito estufa nestes países detentores das florestas, como o Brasil.
Outro ponto destacado pelo relatório é a aceleração da perda florestal. Entre 2000 e 2012, a média era de 7,2 milhões de hectares de floresta tropical destruídos por ano no mundo. Este volume teve um salto e aumentou 52% no período entre 2013 e 2019, que apresentou um volume médio anual desmatado de 10,9 milhões de hectares por ano. Brasil, Indonésia e República Democrática do Congo (RDC) juntos foram responsáveis por 51 por cento de toda a perda de floresta tropical entre 2013 e 2019. Todos os três viram aumentos na perda anual média (de 14 por cento, 17 por cento e 162 por cento, respectivamente ) durante este tempo, alerta o relatório.
A porcentagem de áreas desmatadas ilegalmente pelo agronegócio também aumentou, de 3,5 milhões de hectares por ano entre 2000 e 2012 para pelo menos 4,5 milhões de hectares anuais entre 2013 e 2019, um crescimento de 28%.
“Todos nós devemos ficar chocados com o fato de a derrubada ilegal de florestas para o agronegócio ser o maior impulsionador do desflorestamento e que isso não para de crescer. Se não interrompermos urgentemente este desmatamento ilegal, não teremos a oportunidade de vencer as três crises que a humanidade enfrenta: mudança climática, perda da biodiversidade e novas pandemias,” afirma Art Blundell, que chefiou o estudo da Forest Trends.
Para determinar o grau em que os produtos agrícolas, consumidos internamente e no exterior, são cultivados em terras de florestas desmatadas ilegalmente, os autores examinaram dados disponíveis sobre desmatamento ilegal em 23 países com cobertura florestal do Sudeste da Ásia, América Latina e África.
Além de produtos como soja, óleo de palma, cacau, café, etc; a pecuária para produção de carne também representa um grande percentual do desmatamento ilegal. No dia 20 de maio de 2021, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra a empresa Alvorada Indústria e Comércio de Carnes (Frigorífico Alvorada) por comercializar produtos bovinos originários de fazendas embargadas e desmatadas a partir de julho de 2008, sem autorização do órgão ambiental competente. Os atos contribuem para o desmatamento da Floresta Amazônica e para degradação do meio ambiente em geral. A empresa tem sede no município de Alta Floresta (MT), distante 790 quilômetros de Cuiabá.
Conforme o Relatório Sobre as Compras do Frigorífico Alvorada Indústria e Comércio de Carnes LTDA, anexado a ACP, dão conta que, entre 1º de janeiro de 2017 e 9 de novembro de 2018, o frigorífico teria comercializado cerca de 31 mil cabeças de gado, o que totalizaria aproximadamente 6,3 mil toneladas de carne, sendo que cerca de 20% dos animais transportados e 15% das Guias de Trânsito Animal (GTAs) emitidas apresentaram alguma irregularidade ambiental relacionada a desmatamento, embargos do Ibama e sobreposição a áreas protegidas na cadeia de fornecedores da referida empresa. Ainda, em termos de área desmatada nas fazendas fornecedoras, foram identificados 3.363 ha de desmatamento detectados pelo Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e validados pelo estudo.
Somente em 2019, 55 bilhões de dólares em exportações dos 23 países do estudo de caso estavam relacionados à destruição de florestas tropicais para a produção de dez itens básicos, a maioria dos quais cultivada na América Latina e Ásia, aponta o relatório, que destaca que consumidores da Europa, Reino Unido, China, Estados Unidos ou outro que importe esses produtos, correm o risco de conivência ao adquirirem esses produtos em seus países. Desmatamento de florestas tropicais desmatadas ilegalmente para soja
“O relatório traz um alerta aos países importadores no sentido de ampliar a conscientização e informação de que estão contribuindo diretamente com o aumento de desmatamento por commodities (carne, soja, madeira, óleo de palma, cacao, café, etc), sendo que 69% de florestas tropicais destruídas entre 2013 a 2019 ocorreu de forma ilegal. No Brasil, por exemplo, segundo dados do INPE [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais] foram desmatados 9.9 milhões de hectares na Amazônia entre 2007-19 e só em 2020 se desmatou mais 1.1 milhão de hectares. Assim, o aumento na pressão dos mercados consumidores pode contribuir para medidas de comando e controle, e para frear o desmatamento no Brasil. É um grande desafio, pois o Brasil está sofrendo uma desestruturação da política de meio ambiente. Exemplo em curso são as leis de Licenciamento Ambiental (PL 3729/04) e a da Regularização Fundiária (PL 2.633 e PL 510), quadro que praticamente anula a governança e governabilidade do Brasil sobre o desmatamento. Então é necessário que medidas sejam tomadas nos países compradores, como por exemplo, exigências de certificado de origem, e leis que criem salvaguardas efetivas para evitar que os commodities exportados do Brasil, assim como de outros países, não causem desmatamento como está ocorrendo atualmente. O estudo revela um dado assustador, 95% do desmatamento no Brasil ocorreu de forma ilegal, assim como 89% na Colômbia, e 50% no Peru”, ressalta José Roberto Borges, diretor da Iniciativa Comunidades e Governança Territorial, da Forest Trends. O relatório aponta ainda que, no Brasil, 25% das áreas de floresta transformadas pela agricultura foram para produtos de exportação (leia na íntegra).
A cultura do agronegócio mais associada ao desmatamento ilegal é a soja, que também é usada para alimentar o gado e outros animais, com cerca de 93% do cultivo em terras desmatadas de forma ilegal; empatada com o cacau, também com 93%; e seguido de perto pela carne bovina, com 91%; e pelo couro, com 87% de produção em áreas deflorestadas de forma ilícita. Os pesquisadores alertam que o impacto de outros produtos básicos, tais como café e milho, está em crescimento. Entre os países estudados, o Brasil lidera nas exportações de soja, carne bovina e couro. Desmatamento de florestas tropicais desmatadas ilegalmente para soja
“O problema é mais complexo, não se pode apenas responsabilizar as grandes empresas. Existe uma divisão dentro do setor do agronegócio, o produtor na ponta e as empresas que vendem insumos (tratores, fertilizantes, traders). O produtor rural na ponta não está cumprindo com a legislação e não quer recuperar vegetação nativa, atualmente o governo os incentiva neste sentido. Já o agronegócio que está mais organizado, por exemplo, pela Associação Brasileira do Agronegócio, tem uma visão mais conectada com o mercado global, com os consumidores mais responsáveis, mas é o setor menos expressivo do agronegócio brasileiro”, analisa José Roberto Borges.Desmatamento de florestas tropicais desmatamento
Por fim, somente a título de informação, veja a diferença entre uma área dedicada à pecuária, outra dedicada ao manejo florestal de espécies nativas e uma lavoura de soja, e tire suas próprias conclusões. Desmatamento de florestas tropicais
Fontes dos textos : OEco – Texto de Duda Menegassi / Ministério Público Federal / Forest Trends
Desmatamento de florestas tropicais
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