Apesar da queda nas taxas de desmatamento no último ano, a Mata Atlântica segue sendo o bioma mais ameaçado do território nacional. Cerca de 71,6% de toda sua vegetação nativa já foi desmatada em razão dos diversos ciclos econômicos do Brasil. Restam, lamentavelmente, apenas 24% da sua cobertura florestal original. Isso significa uma perda significativa de florestas maduras – mais antigas, que possuem maior biodiversidade e carbono estocado, não recuperáveis.
Frente ao problema, a criação da Lei da Mata Atlântica em 2006 surgiu como uma iniciativa nacional de assegurar a exploração consciente dos recursos, a fim de não prejudicar os ecossistemas que fazem parte da floresta. Contudo, a legislação enfrenta diversas dificuldades na aplicação das regras, como a falta de monitoramento, de incentivo financeiro e apoio político, o que deixa brechas para a desflorestação.
O desmate do bioma já chegou ao nível de esforço internacional. A Fundação SOS Mata Atlântica participou da última Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2024 (COP29) – o principal fórum internacional para negociações climáticas –, no início deste mês, novembro, em Baku, no Azerbaijão, e levou a urgência de ações para proteger e restaurar a Mata Atlântica. A Fundação destacou a centralidade do ecossistema nas soluções climáticas e hídricas para o Brasil.
Nesse sentido, condução da regeneração natural e plantio de mudas são alguns dos métodos possíveis para a recuperação do bioma. Apesar das florestas maduras serem cruciais e insubstituíveis, projetos de restauração de áreas degradadas são uma forma de aumentar a cobertura florestal, freando as mudanças climáticas. À luz desse cenário, projetos ilustres da comunidade acadêmica buscam prestar suporte a fim de acabar com o aniquilamento da Mata Atlântica.
Esse é o caso do Projeto Restauração Ecológica da Floresta Ombrófila Mista (Reforma), em que Alexandre Siminski atua como coordenador. Siminski é professor associado da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) de Curitibanos, graduado em Agronomia, e mestre e doutor em Ciências, com área de concentração em Recursos Genéticos Vegetais, pela mesma universidade. O Reforma, está restaurando 302 hectares de Mata Atlântica em florestas do Meio-Oeste e do Planalto Serrano catarinense.
O projeto surgiu a partir de um edital do Fundo Nacional do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e iniciou as atividades em 2021. Além do financiamento do BNDES, também conta com a gestão financeira da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu). Os 302 hectares foram divididos em duas localidades, 92 hectares da Unidade de Conservação Parque Estadual do Rio Canoas (Paerc), em Campos Novos, e 210 hectares do assentamento de reforma agrária Índio Galdino, nos municípios de Curitibanos e Frei Rogério.
“As estratégias são um pouco distintas. Lá no parque do Rio Canoas o principal fator de degradação ambiental é a invasão biológica com pinus. No passado, antes de ser uma unidade de conservação, a área pertencia a uma empresa produtora de madeira, através dasilvicultura de pinus. Quando a área passou a ser uma unidade de conservação, esses pinus foram retirados, porém alguns trabalhos posteriores identificaram o problema da invasão biológica. Então nossa principal ação no Parque Estadual é o controle dessa invasão biológica e a promoção da regeneração natural nessas áreas”, explica o professor sobre a atuação no Paerc.
“Já no assentamento Índio Galdino são 51 lotes, ou seja, 51 propriedades rurais e eles têm em comum a área de reserva legal coletiva. E, por diversos motivos ao longo do tempo, desde que se instalou o assentamento, não existe um limite físico, ou seja, uma cerca, algo que identifique claramente onde são os lotes e onde é a reserva. Isso fez com que ao longo do tempo […] alguns agricultores acabassem avançando um pouco sobre as áreas de reserva para fazer suas atividades.”
“Hoje o principal foco de ação na dentro do assentamento é o cercamento, a identificação. […] E, posteriormente, a recuperação das áreas dentro dessas áreas de reserva legal. O projeto Reforma tem trabalhado com 3 estratégias: a Regeneração Natural, os Sistemas agroflorestais (SAFs) e o plantio de mudas, também é conhecida como restauração ativa”, conclui Siminski sobre o plano de atuação.
Além de promover uma experiência para os alunos e professores da UFSC, o Reforma busca envolver a comunidade local no assentamento Índio Galdino com o intuito de promover uma efetividade a longo prazo do projeto. Oficinas, capacitação dos agricultores, quintais agroecológicos, e construção de viveiro de plantas nativas para a produção de mudas são algumas das atitudes adotadas.
Quanto ao cercamento no assentamento, é necessário para promover a restauração ecológica e conservação da floresta antiga, e ainda ajudará na qualidade da água consumida pelos moradores, que atualmente está contaminada em decorrência da passagem de animais como o gado.
Sobre a motivação para a determinação da área em que o projeto acontece, Alexandre Siminski pontua: “Nós [da UFSC] estamos numa região de altitude de mais de mil metros, então as iniciativas de pesquisa e restauração com esses ecossistemas associados à Mata Atlântica de clima mais frio, como é a floresta da araucária, não são tão frequentes. Isso é uma motivação interessante. No caso do Parque Estadual do Rio Canoas, está numa divisão entre a floresta ombrófila mista e a floresta estacional decidual. É, provavelmente, a formação florestal mais ameaçada que a gente tem no Estado de Santa Catarina. São várias espécies ameaçadas de extinção presentes nesse bioma: a Araucária, a Imbuia e o Xaxim, o Butiá-da-serra”.
O Reforma surge como inspiração para futuros projetos ambientais e busca incentivar os estudantes a com restauração em seus empregos seguintes. Combinados com auxílios internacionais e com a efetivação da legislação brasileira, o objetivo é proteger as formações florestais da Mata Atlântica e contribuir para o crescimento de sua cobertura.
“O pessoal sempre fala sobre como ganhar escala na restauração. Isso pressupõe que as pessoas conheçam, se envolvam e façam a sua parte. Nós estamos aqui fazendo a nossa parte, nos nossos 300 hectares iniciais. Obviamente a ideia é dar sequência a outros projetos nessa linha, especialmente com a implantação na UFSC do Centro Reforma de Restauração Ecológica. Não finalizaria aqui. Mas, para mim, o que fica de mais forte é essa formação das pessoas, […] os nossos alunos que hoje estão se formando aqui estarão se envolvendo com isso amanhã, vão estar no mercado de trabalho, vão estar trabalhando em empresas, vão estar atuando muitas vezes em órgãos públicos. E vão estar promovendo essa questão da restauração a partir daquilo que eles tiveram a oportunidade de vivenciar dentro da universidade” finaliza Alexandre Siminski.
Acesse o site do projeto para mais informações: https://projetoreforma.ufsc.br/.
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