Pesquisa investiga correlação entre vida primitiva e processos geológicos

Há cerca de 2 bilhões de anos, durante a Era Paleoproterozoica, ocorreu um evento sem precedentes na história da Terra, um evento que representou um marco crucial para a evolução da vida – o Lomagundi-Jatuli. Naquele período, ocorreu o maior e mais prolongado desvio nos níveis de carbono registrados no planeta. Acredita-se que o episódio esteja ligado a um aumento significativo na quantidade de oxigênio nos oceanos e na atmosfera.

Área da mineração no município cearense de Ocara, onde foi realizado o estudo: evidência de que o carbono orgânico pode ter desempenhado um papel ativo em processos geológicos. Foto. Jornal da Unicamp.

Novas evidências sobre as condições ambientais da Terra naquele período foram encontradas por um grupo de pesquisadores brasileiros e apresentadas em um artigo na Scientific Reports, uma revista do grupo Nature. A publicação, assinada por Felipe Holanda Santos (Unicamp/Universidade Federal do Ceará – UFC), Wagner da Silva Amaral (Unicamp), Evilarde Carvalho Uchôa Filho (Serviço Geológico do Brasil/UFC), Fabrício de Andrade Caxito (Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG), Ana Clara Braga Souza (UFC), Douglas Teixeira Martins (Instituto Federal do Piauí – IFPI) e Brenda de Andrade Feitosa (Universidade Federal do Oeste do Pará – Ufopa), preenche lacunas sobre como a vida influenciou processos geológicos da Terra em seus estágios iniciais a partir da análise de rochas ricas em grafita coletadas no norte da Província Borborema, no nordeste do Brasil.

A grafita é um mineral composto de carbono, base essencial da vida. O artigo traz como novidade justamente a evidência de que o carbono orgânico, presente em rochas ricas em grafita, pode ter desempenhado um papel ativo em processos geológicos de formação de minerais. O estudo sugere que a grafita acumulada em sedimentos ricos em manganês pode ser derivada de matéria orgânica antiga, possivelmente bacteriana.

“Isso reforça a ideia de que a vida influenciou diretamente o ciclo de carbono e a formação mineral no passado da Terra”, explica Santos, que defendeu seu doutorado em 2021 no Programa de Pós-Graduação em Geociências do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp sob orientação de Amaral, docente do Departamento de Geologia e Recursos Naturais do mesmo IG. “A pesquisa ajuda a compreender melhor a evolução ambiental e biológica do nosso planeta durante eventos geológicos de grande escala”, diz o estudioso.

O professor Wagner da Silva Amaral: relação entre a grafita e mineirais de manganês encontrados nas rochas. Foto. Jornal da Unicamp.

De acordo com Amaral, Santos iniciou uma pesquisa no IG estudando depósitos de manganês a partir de material coletado em uma mina do nordeste do Ceará. A Província Borborema é uma região-chave para entender como se formaram esses depósitos. Lá, os pesquisadores tiveram acesso a testemunhos de sondagem feitos por uma empresa de mineração. Esses furos de sondagem permitem a coleta de amostras de rochas da subsuperfície.

“O acesso a esse material é muito difícil porque é caro e as empresas em geral não costumam fornecê-lo”, lembra Amaral. Os resultados da análise indicaram que as rochas com grafita se formaram em altas temperaturas, de até 634 ºC, por meio de metamorfismo – processo que altera a estrutura físico-química das rochas. “Essa descoberta é importante porque mostra que o carbono orgânico pode ter sido parcialmente liberado [desgaseificado] durante esse aquecimento, mas que, ainda assim, uma parte significativa ficou preservada”, explica o docente do IG.

A relação entre a grafita e os minerais de manganês encontrados nas rochas também constitui um outro ponto importante da pesquisa. Segundo Amaral, no início dos trabalhos, os pesquisadores queriam entender por que a grafita e o cobalto estavam presentes em rochas com manganês. O grupo, no entanto, foi além: buscou compreender como e quando a grafita encontrada se formou. Para isso, Santos investigou o mineral a partir de um método chamado urânio-chumbo em zircão, usado para determinar a idade de minerais isolados, e assim estabeleceu a idade desses compostos de carbono: 2 bilhões de anos atrás. “A explosão da vida ocorreu em torno de 540 milhões de anos atrás. As assinaturas de carbono adquiridas com essas análises revelaram que essa grafita tinha, portanto, uma origem biogenética”, explica Amaral.

Os pesquisadores conseguiram assim demonstrar que, no contexto da Era Paleoproterozoica, as grafitas, das quais não se sabia a gênese, têm um ancestral biológico. “Com essa investigação, estamos ajudando a preencher lacunas sobre a evolução do Sistema Terra, ao mesmo tempo em que trazemos à luz detalhes cruciais sobre como a vida influenciou os processos geológicos há bilhões de anos”, afirma Amaral. Para o docente, “eventos como o Lomagundi-Jatuli são de extrema importância para a evolução do nosso planeta, mostrando como a interação entre a vida, a química dos oceanos e as mudanças ambientais moldou-o tal qual o conhecemos hoje”.

O artigo, parte do doutorado de Santos, integra um projeto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) sobre cobalto e manganês. Os demais coautores estão ligados a esse projeto e refinaram os resultados encontrados pelo pesquisador a fim de garantir a precisão científica do trabalho.

Santos trabalhou como professor durante seus estudos na pós-graduação. Por isso, não recebeu bolsas de estudo. No entanto, para realizar sua pesquisa, contou com o apoio financeiro da Society of Economic Geologists (SEG). Atualmente, ele integra o corpo docente da UFC e segue investigando os depósitos minerais e a evolução do planeta na Era Paleoproterozoica em parceria com colegas da Unicamp. Por seu empenho como pesquisador, Santos receberá, da Sociedade Brasileira de Geologia (SBGEO), a medalha Martelo de Prata 2024, destinada a profissionais das geociências que se destacam na produção em pesquisa científica ou trabalhos técnicos e que tenham concluído seu curso de graduação há, no máximo, dez anos.

Fonte: Jornal da Unicamp


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Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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