Os ventos, a baixa umidade e grande quantidade de biomassa seca são condições ideais para a ocorrência de queimadas.
Fonte: Caliandra do Cerrado |
temperatura média anual fica em torno de 22-23ºC, sendo que as médias mensais
apresentam pequena estacionalidade. As máximas absolutas mensais não variam
muito ao longo dos meses do ano, podendo chegar a mais de 40ºC. Já as mínimas
absolutas mensais variam bastante, atingindo valores próximos ou até abaixo de
zero, nos meses de maio, junho e julho. A ocorrência de geadas no Domínio do
Cerrado não é fato incomum, ao menos em sua porção austral.
precipitação média anual fica entre 1200 e 1800 mm. Ao contrário da
temperatura, a precipitação média mensal apresenta uma grande estacionalidade,
concentrando-se nos meses de primavera e verão (outubro a março), que é a
estação chuvosa, curtos períodos de seca, chamados de veranicos, podem ocorrer
em meio a esta estação. No período de maio a setembro os índices pluviométricos
mensais reduzem-se bastante, podendo chegar a zero, esta é a estação seca no
Cerrado.
fogo é um componente fundamental da história evolutiva da vegetação do Cerrado,
pesquisas indicam que no bioma existem vestígios de ocorrência de queimadas
naturais há mais de 30 mil anos antes do presente (A.P.), bem antes da chegada
dos primeiros humanos à região onde os mais antigos registros já datados são de
cerca de 11 mil anos A. P.. Porém, o fogo de origem natural geralmente
era ocasionado por raios já no início da estação chuvosa, em que a biomassa
vegetal seca era combustível para que ocorresse a combustão, só que na
sequência as chuvas impediam que o fogo se espalhasse e tomasse grandes proporções.
Após a chegada dos primeiros seres humanos à região e, principalmente após a
constituição de agrupamentos populacionais de grupos sedentários, a história
começa a mudar.
informações disponíveis revelam que o uso do fogo já era muito difundido
entre todos os grupos indígenas que habitavam os cerrados. Por meio
do fogo, eles manipulavam o ambiente e se beneficiavam de diversas
maneiras: estimulavam a floração e a frutificação de plantas que lhes
eram úteis, atraíam e caçavam animais que vinham comer a rebrota do
estrato herbáceo, espantavam animais indesejáveis – como cobras –,
livravam-se de algumas pestes (insetos, ácaros), “limpavam” áreas para
instalar suas vilas e seus cultivos, além de se utilizarem do fogo
para sinalização e em rituais religiosos. Além disso, os indígenas não queimavam extensas áreas, as queimas eram realizadas em mosaicos, ou seja, enquanto uma área era queimada dava-se tempo para as outras áreas se recuperarem.
Parte desse
conhecimento foi transmitida aos agricultores e pecuaristas, porém,
ao contrário dos indígenas, seu estilo de vida sedentário não lhes
permitia manter o sistema de queima em mosaico, nem esperar alguns
anos para voltar a queimar o mesmo local, pois necessitavam
maximizar, temporal e espacialmente, os benefícios do fogo. Disso
resultou um aumento na frequência e na extensão das áreas queimadas,
ocasionando, muitas vezes, a degradação do ambiente, em termos de
esgotamento das terras, erosão, exclusão do estrato arbóreo,
extermínio de espécies nativas, infestação por espécies ruderais (aqui entendidas como invasoras),
dentre outros. As queimadas acidentais também se configuram como um grave problema, elas são causadas por faíscas de fogueiras, bitucas de cigarro ou até mesmo vidro e latas de bebida que são dispensados nas margens das rodovias. Como o fogo iniciado acidentalmente não é monitorado, esse pode se espalhar rapidamente devido a grande ocorrência de ventos e a biomassa seca de gramínea que nesta época está disposta em grandes quantidades, sendo um ótimo combustível para o avanço rápido desse fogo.
O fato é que apesar das adaptações da vegetação e até de certa parcela da fauna à incidência de queimadas, o fogo de ocorrência natural acontece em um ciclo de 6 a 10 anos e de origem antrópica em um ciclo de 2 a 3 anos, esse curto espaço de tempo não permite a recuperação e o ciclo natural do bioma o que acaba gerando ambientes mais abertos e com predominância de gramíneas e a redução de áreas de floresta.
Uma série histórica do Programa de Monitoramento de Queimadas do INPE, com dados de 1998 a 2017, mostram que é justamente durante a estação seca (maio a setembro) que são registrados os maiores índices de focos de calor na região de abrangência do Cerrado, indo contra a tendência natural de ocorrência do fogo que seria no inicio da estação chuvosa (final de outubro), como pode ser observado no gráfico abaixo.
Comparativo dos dados do ano corrente com os valores máximos, médios e mínimos de focos de calor para período de 1998 até 13/06/2017. Fonte: INPE. |
A média de registro de focos de calor para o mês de maio (início da estação seca) é de 2.215 focos, chegando no mês de setembro (mês com maior incidência de queimadas) a uma média de 20.114 focos, sendo a máxima de 44.518 focos detectados em set. de 2010. É na seca que ocorrem ventos mais intensos no Cerrado que, aliados ao clima seco de até menos de 15% em algumas regiões (ex.: DF), espalham o fogo com grande velocidade o que acaba dificultando seu controle. Clique aqui e entenda a relação entre focos de calor e queimadas
O que acontece com a flora e a fauna durante esse período de ocorrência de queimadas?
Como
as plantas não podem fugir do fogo, claro, elas são queimadas. Todavia, a flora do cerrado evoluiu junto com as queimadas naturais
provocadas pelos raios e assim, ao longo dos milênios, adaptou-se
a este fator ambiental natural. Uma semana depois de uma queimada muitas
plantas já estão rebrotando com grande vigor. É claro que algumas não suportam as altas temperaturas
e morrem. O estrato arbóreo-arbustivo é mais sensível ao
fogo que o estrato herbáceo-subarbustivo. Após uma queimada
ou queimadas repetidas, algumas árvores e arbustos morrem, abrindo
assim a vegetação. Desta forma um cerradão pode
paulatinamente transformar-se, com as queimadas sucessivas, em um cerrado
“sensu-stricto”, um campo cerrado, um campo sujo ou um campo
limpo.
São
insuficientes as pesquisas do efeito do fogo sobre a fauna dos Cerrados.
O número de vertebrados de maior porte encontrados mortos logo após
as queimadas acidentais parece variar muito. Após o desastroso incêndio
do Parque Nacional das Emas de 1988, noticiou-se apenas a morte de uma
tamanduá-bandeira junto com seu filhote. Já em outros incêndios a que
se submeteu aquele mesmo parque, o número de animais mortos pelo fogo
parece ter sido bem maior. A fauna de vertebrados de pequeno e médio
porte, muito mais numerosa, refugia-se em buracos existentes no solo,
escapando assim ao fogo. O que nos parece certo é que os incêndios,
onde o fogo avança fora de qualquer controle, são muito mais danosos
para a fauna do que queimadas prescritas, feitas em pequenas áreas e
sob um rigoroso controle.
Ressurgindo das cinzas
Floração após passagem do fogo. |
É
impressionante a rapidez e o vigor com que as plantas do Cerrado emitem
novos brotos logo após a queimada. Bastam poucas semanas para que o
verde reapareça e substitua o tom cinza deixado pelo fogo. Entre as
árvores, o barbatimão é um bom exemplo desta incrível capacidade regenerativa.
No estrato herbáceo/subarbustivo, bastam alguns dias para que seus órgãos
subterrâneos recomecem a brotar. Curiosamente, muitas de suas espécies
iniciam o rebrotamento com a produção de flores. Pouco
tempo após a passagem do fogo, o Cerrado transforma-se num verdadeiro
jardim, onde as diferentes espécies vão florescendo em sequência. Este
estímulo ou indução floral não é necessariamente provocado pela elevação
da temperatura, como se poderia esperar. Em muitos casos é a eliminação
total das partes aéreas das plantas que as faz florescer. Além de estimular
ou induzir a floração, o fogo sincroniza este processo em todos os indivíduos
da população, facilitando assim, a polinização cruzada. Se não houver
queima, ou as plantas não florescem ou o fazem com muito menor intensidade
e de forma não sincronizada.
Alterações fisiológicas após o fogo. |
Há espécies, todavia, que se comportam
de maneira bastante diversa. É o caso do capim-flecha (Tristachya
leiostachya), que domina de forma absoluta o estrato herbáceo/subarbustivo
dos cerrados do Parque Nacional das Emas. Esta espécie floresce e frutifica
durante o período primavera/verão. Entretanto, se o cerrado é queimado,
ela quase não produz inflorescências na primavera/verão subsequente.
Somente
no segundo período de floração, isto é, um ano depois, é que ela irá
florescer de forma intensa. Este comportamento faz com que a fitomassa
seca cresça enormemente 2-3 anos após a passagem do fogo, aumentando
em muito o risco de um novo incêndio. Isto talvez explique a periodicidade
com que se observam os grandes incêndios daquele Parque (1985, 1988,
1991, 1994).
Candombá – A fênix do Cerrado
Outro exemplo são os candombás, uma Vellozia típica de cerrados rupestres. Após um incêndio ocorrido na Chapada Diamantina que atingiu cerca de 51 mil hectares, um campo com predominância de candombás floriu de forma exuberante, a última florada assim registrada no local havia sido há 17 anos atrás. Isso se deu no ano de 2016, após o incêndio que ocorreu no ano de 2015, alguns já chamavam essa espécie de “fênix do Cerrado” e essa florada veio a confirmar esse fato. Veja a exuberância do campo de candombás na foto abaixo:
Fonte: Portal Geo Referência. FOTO: Rui Rezende |
Fontes: INPE, Cerrado – por Leopoldo Coutinho, Portal Brasil, IBAMA, Miranda HS & Sato MN, 2005. Efeitos do fogo na vegetação do Cerrado. In____Cerrado: Ecologia, Biodiversidade e Conservação., Henriques RPB, 2005. Influência da história, solo e fogo na distribuição e dinâmica das fitofisionomias no bioma Cerrado. In:____Cerrado: Ecologia, Biodiversidade e Conservação.
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Muito controverso esse tema mas bem abordado. Infelizmente o que se vê é uma apropriação do fato científico para justificar as queimadas como algo benéfico ao cerrado, enquanto este caminha para a degradação.
Perfeito!