Perdida entre as sombras verdes e a umidade infinita da floresta amazônica, uma nova espécie de sapo venenoso foi revelada ao mundo — Ranitomeya aetherea sp., o pequeno sapo-ponta-de-flecha de corpo azul celeste e pernas com reflexos de cobre, que parece ter saído de um sonho tropical.

A descoberta foi feita nas florestas abertas ao redor da bacia do rio Juruá, que nasce no Peru e que banha os estados do Acre e Amazonas, no Brasil, por uma equipe internacional de cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), em colaboração com o Museu Nacional da República Tcheca. O trabalho, fruto de anos de expedições e estudos, amplia o já vasto catálogo da biodiversidade amazônica e quebra um jejum de mais de uma década sem o registro de novas espécies do gênero Ranitomeya.
Esses pequenos sapos, famosos por suas cores vibrantes e toxinas potentes, sempre despertaram fascínio — tanto pela beleza quanto pela complexidade. Embora minúsculos, abrigam uma química letal na pele e um comportamento parental intricado, o que os torna objeto de inúmeros estudos e também de muitas perguntas ainda sem resposta.
Sobre a espécie
O gênero Ranitomeya reúne apenas 16 espécies conhecidas, distribuídas entre o norte da América do Sul e as matas amazônicas. Algumas têm áreas de ocorrência restritas, outras exibem variações sutis de cor e forma, o que torna difícil perceber onde termina uma espécie e começa outra. Mesmo assim, a floresta ainda surpreende — e foi justamente em uma de suas regiões mais isoladas, a bacia do rio Juruá, que a ciência encontrou esse novo tesouro.

O pequeno anfíbio — que mede aproximadamente 1,5 centímetro de comprimento — e de coloração intensa, é uma aparição rara. O nome vem do latim e significa “celestial”, uma homenagem ao tom azul que atravessa o corpo do animal.
“Também é uma forma de traduzir o encantamento e a delicadeza de encontrá-lo na natureza — como se viesse de outro mundo”, escreveram os autores do estudo.
A descoberta
Chegar até a bacia do Juruá exigiu mais do que técnica: foi preciso resistência e colaboração. Os pesquisadores voaram em um pequeno avião, navegaram por dez horas de barco e caminharam por trilhas fechadas, guiados por moradores locais que abriram caminho e compartilharam saberes. Em meio a uma área dominada por palmeiras, o som inconfundível do novo sapo rompeu o silêncio da floresta.
Durante a estação chuvosa de 2024, os cientistas observaram o comportamento da nova espécie em seu habitat. Descobriram que ela é mais ativa no início e no fim do dia, mas, sob a chuva amazônica, se mantém desperta o tempo todo. Vive entre plantas de bananeira-brava e se abriga sob folhas de palmeira caídas, um padrão que ajuda a escapar de predadores e manter a umidade da pele.
No total, 26 indivíduos foram coletados, incluindo cinco girinos, e o canto de sete machos foi gravado. Cada vocalização dura poucos milissegundos, mas carrega de 16 a 35 notas, um som único na sinfonia da floresta. As análises genéticas confirmaram: tratava-se de uma espécie completamente nova.

O achado reforça o papel do rio Juruá como uma fronteira pouco explorada da Amazônia, abrigando ecossistemas de rara integridade e, ainda assim, vulneráveis. O isolamento protege, mas também esconde — e a região enfrenta pressões crescentes do desmatamento e da mudança climática.
Pequeno em tamanho, imenso em significado para a conservação
Os pesquisadores reconhecem que não se sabe ainda se o Ranitomeya aetherea está ameaçado, mas a própria descoberta é um lembrete: há muito mais vida na floresta do que conseguimos enxergar. Cada novo registro é uma peça do quebra-cabeça da biodiversidade, e também um chamado à conservação.
Entre tantos riscos e incertezas, a aparição de um sapo azul e acobreado pode parecer pequena. Mas, para a ciência e para quem acredita no poder da natureza de se reinventar, é um lampejo de esperança em tempos turbulentos.
As informações correspondentes foram retiradas do artigo: A remarkable new blue Ranitomeya species (Anura: Dendrobatidae) with copper metallic legs from open forests of Juruá River Basin, Amazonia (DOI: 10.1371/journal.pone.0321748).
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