Grifes de luxo usam couro ligado ao desmatamento ilegal no Pará, diz estudo

Investigação revela que marcas como Chanel, Gucci e Coach utilizam couro de frigorífico envolvido com gado criado em áreas embargadas e terras indígenas.

Grifes de luxo como Chanel, Balenciaga, Gucci e Coach estão associadas, direta ou indiretamente, a uma cadeia de fornecimento de couro vinculada ao desmatamento ilegal e à invasão de terras indígenas no Pará. A revelação vem de uma investigação conduzida pela ONG britânica Earthsight, publicada em parceria com a Repórter Brasil nesta terça-feira (23).

Segundo a ONG Earthsight, couro exportado para empresas italianas foi originado em curtume abastecido por frigorífico apontado como comprador de gado criado em áreas embargadas e terras indígenas (Foto: Daniel Beltrá/Greenpeace)

O estudo analisou decisões judiciais, imagens de satélite, registros de exportação e entrevistas com atores da cadeia do couro, revelando que a empresa brasileira Frigol, um dos maiores frigoríficos do país, está no centro da rede de fornecimento. A Frigol é acusada de adquirir gado de áreas embargadas por desmatamento e de fazendas situadas ilegalmente dentro da Terra Indígena Apyterewa, em São Félix do Xingu (PA).

Do Pará para o luxo europeu

Segundo o relatório, a maior parte do couro exportado do Pará para a Europa tem como destino a Itália, onde é processado por curtumes como a Conceria Cristina e a Faeda, ambos localizados no Vêneto. Esses curtumes vendem o material como “couro italiano” para marcas dos setores da moda, automotivo e de design. Entre seus clientes estão Coach, Chanel, Gucci e Balenciaga.

A Durlicouros, maior exportadora de couro do Pará para a Europa, teria vendido 90% de toda a produção do estado entre 2020 e 2023 — cerca de 14,7 mil toneladas. A empresa confirmou à Earthsight que compra peles do frigorífico Frigol.

Reincidência e omissão

Apesar de multas anteriores e alertas de órgãos ambientais, como o Ibama, a Frigol continuou adquirindo gado de áreas embargadas até pelo menos outubro de 2023, segundo o relatório. Em 2019, a empresa foi multada em quase R$ 2 milhões pela compra de 3.643 cabeças de gado criadas ilegalmente em áreas proibidas. Mesmo assim, novas aquisições continuaram sendo feitas nos anos seguintes, sem o tempo mínimo para recuperação das áreas desmatadas.

A prática de triangulação — quando o gado é transferido de uma fazenda ilegal para outra regularizada antes de ser vendido ao frigorífico — dificulta a rastreabilidade e favorece a ocultação da origem ilícita dos animais.

Terra Indígena Apyterewa

A Frigol também foi apontada como compradora de gado de pecuaristas processados por manter criações ilegais dentro da Terra Indígena Apyterewa, uma das mais invadidas do país. O Ministério Público Federal (MPF) processa 33 fazendeiros e duas empresas por criarem mais de 47 mil bovinos ilegalmente na TI. Ao menos 14 desses fazendeiros venderam mais de 17 mil cabeças de gado para a Frigol entre 2020 e 2023 — volume suficiente para produzir cerca de 425 toneladas de couro.

Respostas e negações

A Frigol afirmou que todas as compras realizadas estão em conformidade com critérios socioambientais, conforme o protocolo Boi na Linha, desenvolvido pelo Imaflora com o MPF. A empresa alegou 100% de conformidade com fornecedores diretos nas últimas três auditorias e planeja mitigar completamente o desmatamento indireto de seus fornecedores de primeiro nível até 2025.

Já a Durlicouros declarou compromisso com a rastreabilidade e responsabilidade na aquisição de couro, mas não comentou os casos específicos apontados pela investigação. As marcas Chanel, Gucci e Balenciaga negaram o uso de couro brasileiro, e a Chanel informou que encerrou sua relação comercial com a Faeda.

A grife Coach e a Conceria Cristina, por sua vez, não responderam aos questionamentos. A Repórter Brasil e a Earthsight seguem com o espaço aberto para manifestações.

Um alerta para o consumidor

“A confiança do consumidor de que produtos de luxo não estão ligados ao desmatamento ou à invasão de terras indígenas é ilusória”, afirma Rafael Pieroni, coordenador da Earthsight para a América Latina. “Sem auditoria real e eficaz da cadeia de suprimentos, nenhuma marca pode garantir que está livre dessas ilegalidades.”

Fonte: Reporter Brasil


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Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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