Greenpeace impede entrada por 18 horas de navio com soja do Brasil

A ONG afirmou que foi para alertar a União Europeia sobre a urgência de aprovar uma legislação mais rigorosa contra o desmatamento.

Reprodução: Greenpeace

Durante 18 horas, ativistas do Greenpeace impediram que um navio com 60 mil toneladas de soja do Brasil entrasse no porto de Amsterdã, na Holanda. A ONG afirmou que foi para alertar a União Europeia sobre a urgência de aprovar uma legislação mais rigorosa contra o desmatamento. A polícia deteve 11 ativistas.

Na noite desta terça-feira (10), o Greenpeace Holanda, com apoio de ativistas de toda a Europa e voluntários, bloqueou um mega-navio que chegou ao país carregado de soja do Brasil. O protesto pacífico, que durou pelo menos 16 horas, tem como objetivo alertar os ministros da União Europeia (UE) sobre a urgência de uma nova legislação “anti-desmatamento” mais forte, que proteja diferentes ecossistemas naturais e os direitos humanos, dentre outras demandas.

Lideranças indígenas brasileiras participaram da atividade, levando seu testemunho e protesto pelos impactos socioambientais provocados pela expansão agropecuária sobre seus territórios.

Os ativistas bloquearam os portões, impedindo a passagem do navio Crimson Ace, de 225 metros, que atracaria no porto de Amsterdã, um dos maiores do mundo. A Holanda é a porta de entrada da Europa para commodities agrícolas  – como óleo de palma, carne e soja para ração animal – que causam desmatamento em países exportadores da América do Sul, Ásia e África, agravando as mudanças climáticas e a crise da biodiversidade.

“Há um projeto de lei na mesa que pode acabar com a cumplicidade da Europa na destruição da natureza, mas está longe de ser forte o suficiente”, disse Andy Palmen, diretor do Greenpeace Holanda.

Segundo levantamento de diversos pesquisadores, a conversão de regiões de vegetação nativa em áreas para pecuária e plantio de soja e outros grãos são os principais vetores do desmatamento em todo o mundo.⁣ E devido ao seu alto consumo, os países da UE são responsáveis ​​por 16% do desmatamento de biomas tropicais ligado a commodities. “Centenas de navios transportando soja para ração animal, carne e óleo de palma chegam aos nossos portos todos os anos. Por meio desse comércio, a Europa compartilha a responsabilidade pelo desmatamento em Bornéu e pelos incêndios no Brasil”, alerta Palmen.

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Reprodução Internet

As lideranças indígenas Alberto Terena, membro da coordenação executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e líder do conselho do povo Terena (MS), e Waduwabati Suyá, presidente da Associação Indígena do Povo Kisêdjê, que luta contra a pressão de fazendeiros que cercam a Terra Indígena Wawi (MT), participaram do protesto.

“Fomos expulsos de nossas terras e nossos rios foram poluídos com veneno, para dar espaço à expansão agropecuária. A Europa partilha a responsabilidade pela destruição das nossas casas. Mas a legislação pode ajudar a impedir a destruição futura. Apelamos aos ministros para que aproveitem esta oportunidade não só de estarem olhando para os povos indígenas mas também para o futuro do planeta. A produção de ração para seus animais industriais, e a carne que chega na Europa não deve mais significar nosso sofrimento”, defende Alberto Terena.

Waduwabati Suyá lembra que, na década de 90, enquanto lutavam pelo reconhecimento e demarcação de seu território ancestral, os Kisêdjê viram o território ser ocupado por fazendeiros que destruíram a floresta para criar gado e depois plantar soja. “Essas fazendas ameaçam os rios e florestas no entorno de nossas terras”, diz ele.

“Esse modelo que se expande infinitamente precisa ser barrado e a floresta precisa ser recuperada, é isso que estamos fazendo nas áreas que retomamos após muitos anos de disputa. Sabemos que o agronegócio ameaça a sobrevivência de muitos povos, e estamos aqui também demandando a aprovação de uma lei forte na Europa, que garanta o respeito aos direitos dos povos e outras comunidades da floresta”, afirma Waduwabati Suyá.

Protesto 

Os ministros dos países membros da UE apresentaram suas primeiras considerações sobre a lei anti-desmatamento durante encontro do Conselho Ambiental do bloco, em 17 de março deste ano. A proposta até então deixava de fora biomas não florestais, como Cerrado e Pantanal, além de conter regras insuficientes para combater violações aos direitos humanos – se limitando a cumprir a lei dos países, que muitas vezes são frágeis e insuficientes.

Como se não bastasse, alguns ministros do bloco vêm tentando enfraquecer a proposta e, assim como o lobby do agronegócio está desmantelando as proteções ambientais no Brasil, lobistas estão invadindo Bruxelas para que possam continuar lucrando com a ameaça à vida humana e à biodiversidade. Um dos pontos que vêm sendo atacados pelo agronegócio é a exigência de rastreabilidade total dos produtos (ou seja, a obrigação de conhecer sua origem do início ao fim da cadeia e garantir que se cumpra com os critérios da lei).

Em 28 de junho, os ministros que fazem parte do Conselho de Meio Ambiente da UE voltarão a se reunir para discutir a proposta. A demanda do Greenpeace Holanda é que seu país e a União Europeia como um todo aumentem a ambição no combate ao desmatamento e às mudanças climáticas.

Compromissos voluntários de empresas, sozinhos, não são capazes de acabar com o desmatamento. Até porque, como a história vem nos mostrando, muitas empresas quebram repetidamente suas promessas, adiando a solução do problema. Por isso, é urgente que os países consumidores elaborem legislações como esta.

Retrocesso no Brasil

Existe uma forte relação entre os alimentos que consumimos, a crise climática e a destruição de florestas e outros ecossistemas em todo o mundo. Hoje, mais terra é utilizada para cultivar comida para animais do que para as pessoas. Um milhão de espécies correm risco de extinção devido à destruição de seus habitats. Mesmo assim, o agronegócio continua avançando sobre ecossistemas e acabando com o nosso futuro.

Políticas públicas robustas de monitoramento, destinação de florestas públicas, fiscalização e controle, aliadas a acordos de mercado como a Moratória da Soja, fizeram o desmatamento despencar na década passada no Brasil. Mas, nos últimos quatro anos, o país conseguiu retroceder a níveis inaceitáveis.

No Brasil de hoje, o Congresso e o Executivo trabalham juntos para legalizar o crime ambiental, beneficiar grandes desmatadores e acabar com os direitos dos povos indígenas, em nome do lucro de grandes corporações.

Por isso, é urgente que países consumidores elaborem legislações anti-desmatamento, para ajudar a promover as mudanças necessárias, de fora para dentro, como é o caso da Lei Anti-desmatamento, a ser aplicada para commodities que chegam na Europa impondo riscos para florestas e ecossistemas de outros lugares.

Para que uma legislação como essa seja realmente efetiva, ela precisa considerar a exclusão de fornecedores que desmatam biomas fundamentais para a preservação do clima, da biodiversidade e de populações tradicionais que neles vivem em harmonia com a natureza. No Brasil, é o caso do Cerrado e do Pantanal, que ficam ameaçados caso apenas a Amazônia seja considerada. Também é essencial que sejam impostas restrições mais firmes em relação a violações dos direitos humanos.

Fonte: G1, Greenpeace


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Reure Macena

Engenheiro Florestal, formado pela Universidade do Estado do Pará (UEPA), Especialista em Manejo Florestal e Auditor Líder - Sistema de Gestão Integrada (SGI). Um parceiro do Florestal Brasil desde o início, compartilhando conhecimento, aprendendo e buscando sempre a divulgação de informações que somem para o desenvolvimento Sustentável do setor florestal no Brasil e no mundo.

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