Gifford Pinchot: o engenheiro florestal considerado o “pai” do movimento conservacionista

Gifford Pinchot, em visita a uma Floresta Nacional dos EUA, no início do século XX. 

Na segunda metade do século 19 os Estados Unidos passavam por um processo de intensa devastação de suas florestas, o que já resultava em problemas com o suprimento de madeira e alterações drásticas nos ambientes naturais. Esse foi um dos principais motivos que fez emergir no país dois movimentos que resultaram em uma nova abordagem acerca da utilização dos recursos naturais e na criação de várias unidades de conservação: o Preservacionismo e o Conservacionismo. Esses dois movimentos travaram um verdadeiro conflito disputado filosófica e politicamente, de um lado a ideia de preservação que defendia a natureza intocada, separada dos seres humanos de modo os ambientes naturais fossem protegidos da exploração e se perpetuassem. Do outro lado a ideia de que os recursos naturais poderiam ser explorados, porém, por uma exploração racional, de modo que fosse possível sua utilização pelas presentes e futuras gerações. 


Tanto o movimento preservacionista como o conservacionista tinham seus líderes, seus seguidores e sua força política. O primeiro tinha como principal expoente John Muir, um naturalista, explorador e escritor que encabeçou uma forte campanha pela preservação de áreas naturais. Nascido na Escócia, John Muir se mudou com sua família para uma fazenda em Wisconsin (EUA), onde aprendeu e se encantou pela beleza e utilidade da natureza. Quando adulto, Muir fez viagens de longas distâncias a pé estudando a botânica e ecologia de diferentes ecossistemas, na década de 1870 passou a publicar artigos em jornais apresentando os resultados de suas pesquisas e defendendo a criação de mais áreas protegidas para a preservação da natureza. Em poucos anos John Muir conquistou influência na política estadunidense, o que resultou na criação do Parque Nacional de Yosemite, em 1890, e outras importantes unidades de conservação, como o Mariposa Grove com suas secoias gigantes, também na fundação do Serviço Nacional de Parques (1916) responsável pela gestão dos parques nacionais e outros locais de interesse histórico, cultural e natural. As ideias defendidas por ele ainda influenciam grande parte dos ambientalistas atuais. 

Já o conservacionismo teve como uma de suas principais figuras o engenheiro florestal Gifford Pinchot, ele é responsável por cunhar a expressão “conservação dos recursos naturais” que dá base a esse movimento. Pinchot era de família de ascendência francesa que fez fortuna com a exploração de madeira na Pensilvânia, porém, os danos do desmatamento descontrolado já eram sentidos por sua família e pela região onde viviam que já apresentava escassez de recursos florestais, ele foi então enviado à Europa para estudar as técnicas de silvicultura desenvolvidas naquele continente que já havia passado por danosas crises florestais. 

Em 1889/90, Pinchot ingressou no curso de Engenharia Florestal pela Escola Nacional de Florestas de Nancy (França) (atualmente com outro nome), durante o período que passou na Europa ele fez uma excursão a florestas modelo na Europa Central e obteve conhecimentos sobre as práticas mais avançadas da Alemanha, Áustria e Suiça. Na Suiça, numa floresta municipal ao sul de Zurique, que estava sob manejo florestal contínuo há mil anos, ele viu a silvicultura depender exclusivamente do corte seletivo e da regeneração natural, passando a acreditar que esse deveria ser o modelo a ser seguido pelos EUA, escrevendo mais tarde em um artigo da Associação Florestal Americana “Acredito que os defensores da reforma florestal na América não podem apresentar um modelo melhor e encorajar de nenhuma fonte mais digna” do que o modelo suiço. Ao retornar aos EUA na década de 1890, Pinchot passou a ser o primeiro engenheiro florestal do país, prestando serviços inicialmente como gestor em florestas privadas voltadas para a produção industrial, em 1898 foi contratado como chefe da Divisão de Silvicultura do Departamento Interior dos EUA.

Em 1905, Pinchot ajudou a criar o Serviço Florestal dos EUA, sendo nomeado como presidente do órgão pelo então presidente estadunidense Theodore Roosevelt, com quem teve grande amizade. A Frente do Serviço Florestal, o engenheiro defendia o que chamava de “uso sábio” das florestas nativas, e com os princípios dessa filosofia publicados ainda em 1905 no manual intitulado “O Uso das Reservas Florestais Nacionais”, onde foi defendido que: 

“O principal objetivo das reservas florestais é o uso inteligente. Embora a floresta e seus interesses dependentes devam se tornar permanentes e seguros, evitando o corte excessivo ou danos ao crescimento jovem, todo esforço razoável será feito para satisfazer demandas legítimas.” 

“O uso dos recursos naturais agora existentes neste continente para o benefício das pessoas que vivem aqui agora. Pode haver tanto desperdício em negligenciar o desenvolvimento e uso de certos recursos naturais como há em sua destruição. … O desenvolvimento de nossos recursos naturais e o uso mais completo deles para a geração atual é o primeiro dever desta geração. ” 

“A prevenção do desperdício em todas as direções é uma questão simples de bons negócios. O primeiro dever da raça humana é controlar a terra em que vive.” 

“Os recursos naturais devem ser desenvolvidos e preservados para o benefício de muitos, e não apenas para o lucro de alguns.”


As ideias de Pinchot estão enraizadas na ética do utilitarismo clássico, o “uso sábio”, como entendido por ele, significava: o uso de recursos naturais para o maior bem do maior número por mais tempo. O novo conceito foi a plataforma do Movimento conservacionista, que foi lançado por ele e por Theodore Roosevelt. Sua “Declaração de Princípios” afirmava: “Consideramos o uso sábio, proteção efetiva, especialmente do fogo, e renovação imediata das florestas em terra melhor adaptadas a esse uso, como uma necessidade pública e, portanto, um dever público”.

Poucos anos após a criação do Serviço Florestal dos EUA, Pinchot e o presidente Roosevelt se manifestaram em favor de um projeto conservacionista que englobasse, além das florestas, o uso do solo e da água, o que veio a ocorrer com a aprovação de leis posteriores. Como engenheiro florestal e silvicultor, Pinchot sabia que o uso inteligente era a resposta para a devastação. Em um salto de imaginação, ele viu que uma extrapolação da ideia para todos os recursos era a chave para o futuro. Mais tarde, ele observou que “a menos que pratiquemos a conservação, aqueles que vierem depois de nós terão de pagar o preço da miséria, degradação e fracasso para o progresso e a prosperidade de nossos dias” (algo bem próximo a ideia de desenvolvimento sustentável que temos atualmente e que é uma das bases dos movimentos conservacionista e socioambiental). Pinchot, a frente do Serviço Florestal, aumentou o número de florestas nacionais de 32 para 149, hoje, essas terras públicas continuam a atender a múltiplos propósitos, incluindo proteção de bacias hidrográficas, preservação de habitats e áreas selvagens, recreação ao ar livre e produção de madeira. Ele ainda se destacou como político, sendo eleito governador do estado da Pensilvânia por dois mandatos. 

Por causa de seu trabalho na área florestal, Gifford Pinchot conseguiu introduzir os princípios e a política de conservação nos EUA, que posteriormente foram importados por inúmeros outros países, como o Brasil. As ideias disseminadas pelo conservacionismo estadunidense serviram de base para a criação das unidades de conservação de uso sustentável em nosso país e vários órgãos que lidam com a temática da conservação dos recursos naturais. 


Algumas frases de Gifford Pinchot sobre a exploração florestal nos EUA e a importância do manejo florestal e conservação dos recursos naturais:



“Quando cheguei em casa, nem um único hectare de governo, estado ou propriedade florestal privada estava sob manejo florestal sistemático em qualquer lugar das florestas mais ricas de todos os continentes. Quando os anos 1890 começaram, a palavra comum para nossas florestas era” inesgotável. “Desperdiçar madeira era uma virtude e não um crime. Sempre haveria muita madeira … Os madeireiros … consideravam a devastação da floresta como normal e o segundo crescimento como uma ilusão de tolos … E quanto a sustentar? Essa idéia nunca havia entrado em suas cabeças: os poucos amigos da floresta eram falados, quando eram mencionados, como teóricos impraticáveis ou fanáticos. Falar sobre a proteção das florestas para o americano não era mais que o zumbido de um mosquito, e quase tão irritante “. (GIFFORD PINCHOT,  BREAKING NEW GROUND , WASHINGTON, DC: ISLAND PRESS, 1998, PÁGINA 27.)



“Sem recursos naturais, a vida em si é impossível. Do nascimento até a morte, recursos naturais, transformados para uso humano, alimentam, revestem, abrigam e nos transportam. Dependemos deles para cada necessidade material, conforto, conveniência e proteção em nossas vidas. Sem recursos abundantes, a prosperidade está fora de alcance “. (GIFFORD PINCHOT,  BREAKING NEW GROUND , WASHINGTON, DC: ISLAND PRESS, 1998, PÁGINA 505.)










Fontes:
American Conservation in the Twentieth Century 


Deep roots – a conceptual history of ‘sustainable

development’ (Nachhaltigkeit)


Gifford Pinchot The First Conservationist 



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