Um estudo publicado por pesquisadores na revista científica Nature, em Agosto desse ano (2023), revisado por pares, revelou que, a diversidade de espécies de árvores nativas protegem contra a gravidade das invasões de árvores não nativas.
Árvores invasoras
As invasões de plantas têm impactos variados nos ecossistemas e no bem-estar humano em todo o mundo. Antecipa-se que, devido à introdução e naturalização assistida pelo homem, as invasões de plantas continuem a aumentar nas próximas décadas, com consequências crescentes na biodiversidade nos ecossistemas florestais nativos. Além disso, essas invasões terão inevitáveis impactos econômicos significativos, afetando a produção de madeira, a agricultura e os meios de subsistência humanos.
Especialmente, as árvores não nativas representam uma preocupação global, uma vez que são frequentemente plantadas longe de sua área de distribuição original para diversos fins, como florestamento, residências ou ornamentação. A propagação ativa de árvores pelos seres humanos pode aumentar o potencial de se tornarem invasoras problemáticas. Dado o papel central das árvores na estrutura e funcionamento dos ecossistemas, essas invasões têm o poder de modificar a composição de plantas, a produtividade, a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos prestados às pessoas.
Embora a ecologia de invasões tenha ampliado nossa compreensão dos fatores que afetam a suscetibilidade dos ecossistemas à invasão e das características que tornam as espécies de plantas mais propensas a se tornarem invasoras, a pesquisa tem sido predominantemente conduzida em escalas locais e regionais, com mecanismos ecológicos variados que afetam o sucesso da invasão em diferentes regiões.
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Portanto, carecemos de uma teoria global unificada que leve em consideração os fatores humanos e ecológicos nas invasões de espécies de árvores. O desenvolvimento de uma compreensão global integrada dessas forças ecológicas e antropogênicas é crucial para aprimorar a tomada de decisões em conservação e manejo.
Como ocorre a invasão por espécies não nativas
Numerosos mecanismos ecológicos foram propostos para explicar a suscetibilidade de diferentes ecossistemas à invasão por espécies não nativas em diferentes locais. A hipótese tradicional sugere que sistemas mais diversos ou ecologicamente complexos apresentam “resistência biótica” à invasão, baseando-se na ideia de que uma maior diversidade na comunidade nativa preenche os nichos ecológicos disponíveis, limitando o espaço de nicho para novas espécies.
No entanto, muitos estudos focaram na riqueza de espécies como indicador desse preenchimento de nicho, o que pode não capturar totalmente a proporção de nichos ocupados. Em vez disso, a diversidade filogenética e funcional pode ser métricas mais informativas.
Outra hipótese, chamada “aceitação biótica”, sugere que locais altamente diversos são ideais para muitas espécies de plantas, promovendo a invasão de espécies não nativas. No entanto, ainda não há uma compreensão unificada da importância relativa desses dois processos concorrentes e sua variação global, resultando no chamado “paradoxo da invasão”.
Além disso, o sucesso da invasão dependerá da estratégia ecológica das espécies invasoras em relação à comunidade nativa receptora. A hipótese de “filtragem ambiental” sugere que as espécies invasoras devem ser semelhantes às nativas adaptadas àquela região para ter sucesso, enquanto a “hipótese de similaridade limitante” postula que as espécies invasoras precisam ser ecologicamente distintas das nativas. A importância relativa desses mecanismos pode variar sob diferentes condições ambientais, como em ambientes adversos versus moderados. No entanto, faltam análises em larga escala que integrem fatores ecológicos e antropogênicos para identificar tendências unificadoras.
Um desafio fundamental é que a atividade humana influencia fortemente os processos de invasão de plantas, amortecendo os fatores ecológicos. Os seres humanos impulsionam as invasões de plantas por meio do transporte eficiente de espécies não nativas, o que pode obscurecer os impactos de fatores ecológicos, como a diversidade nativa. A importância dos fatores humanos, como a proximidade de portos e áreas densamente povoadas, pode atenuar as relações ecológicas. Portanto, é fundamental examinar como os fatores ecológicos e antropogênicos afetam a invasão de árvores não nativas em escala global.
O estudo utilizou um conjunto de dados global de inventários florestais para avaliar a importância relativa da influência ecológica e antropogênica na invasão de árvores não nativas. Três hipóteses foram exploradas, sendo:
- que a maior diversidade nativa reduz a invasão não nativa;
- que altos níveis de filtragem ambiental levam à semelhança das espécies invasoras com as nativas em ambientes extremo;
- e que fatores humanos, como a proximidade de portos e densidade populacional, mediam essas relações.
Essas análises foram realizadas em relação a várias métricas de biodiversidade, fornecendo uma compreensão abrangente das interações entre processos ecológicos e influência humana na invasão de árvores não nativas. Esse conhecimento é vital para a prevenção e gestão das invasões de árvores não nativas, visando mitigar seu impacto ecológico e socioeconômico.
Utilizando o banco de dados da Iniciativa Global para a Biodiversidade Florestal, determinamos o status das árvores nativas (nativas ou não-nativas) de acordo com os bancos de dados da Flora Exótica Naturalizada Global e do KEW Plants of the World. Este conjunto de dados abrangeu 471.888 parcelas, das quais 4,9% das parcelas foram invadidas ou continham pelo menos uma espécie de árvore não nativa. Além disso, este conjunto de dados continha uma proporção maior de parcelas invadidas em sistemas tropicais (15,2%) do que em sistemas temperados (5,2%).
No geral, foram identificadas 249 espécies de árvores não nativas individuais, sendo as mais frequentes Robinia pseudoacacia , Pinus sylvestris , Maclura pomifera , Picea abies e Ailanthus altissima rotuladas como não nativas em 3.976, 2.603, 2.493, 2.468 e 1.597 parcelas, respectivamente. As regiões com maior probabilidade de serem invadidas incluem a América do Norte, Europa e Leste Asiático, consistente com descobertas anteriores. Para testar os fatores de invasão de árvores não nativas e estratégia de invasão, usou-se uma versão reduzida do conjunto de dados que consiste em 17.738 parcelas florestais, distribuídas em 14 biomas proporcionais à sua cobertura global da terra.
A diversidade limita a gravidade da invasão
Descobriu-se que os fatores antropogênicos tiveram um impacto mais significativo do que a diversidade de árvores nativas locais na determinação da presença global de invasões não nativas. Por outro lado, a diversidade nativa, tanto filogenética quanto funcional, desempenhou um papel mais relevante na determinação da gravidade da invasão. Isso sugere a influência da pressão de propágulos induzida pelo ser humano nas fases iniciais das invasões florestais, enquanto a biodiversidade nativa atua na moderação da gravidade das invasões.
Além disso, constatou-se que as parcelas florestais localizadas mais próximas dos portos tinham uma maior probabilidade de serem invadidas. Não foi observada uma relação consistente entre a densidade populacional humana e a presença de invasões não nativas, embora essa relação tenha variado entre métricas de diversidade e zonas bioclimáticas. A densidade populacional esteve consistentemente positivamente correlacionada com a probabilidade de invasão, mas pode ser um preditor mais fraco, pois mede apenas a presença humana, que não necessariamente reflete a pressão de propágulos.
Há muito tempo é reconhecido que a proximidade de portos exerce influência sobre as invasões, pois locais mais próximos dos portos geralmente enfrentam uma pressão maior de propágulos não nativos. Além disso, a proximidade dos portos pode ser um indicativo do tempo de residência, uma vez que parcelas mais próximas dos portos tendem a ter uma exposição mais prolongada à pressão de propágulos não nativos, aumentando assim a probabilidade de invasão.
No entanto, em distâncias consideravelmente maiores, processos estocásticos e padrões históricos de uso da terra podem começar a reduzir a importância dos portos. Por exemplo, a terceira espécie não nativa mais comum no conjunto de dados do estudo, M. pomifera, está amplamente naturalizada no interior da América do Norte, onde tem sido utilizada para diversos fins agrícolas desde a década de 1850. Esses resultados destacam a utilização variada de árvores em todo o mundo, levando a tendências únicas de invasão em comparação com plantas herbáceas.
Em escalas mais locais, esse sinal evidente de atividade antropogênica e pressão de propágulos relacionada à diversidade nativa que influencia a presença de invasões está em conformidade com pesquisas anteriores que consideram as invasões em estágios e com avaliações recentes das invasões de árvores em níveis regional e global, enfatizando o papel fundamental dos seres humanos na reconfiguração das comunidades biológicas.
Fonte: Native diversity buffers against severity of non-native tree invasions | Nature
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