Entenda os argumentos dos que criticam e de quem defende a mineração em áreas indígenas

Projeto que prevê liberar atividades econômicas nas reservas indígenas terá, nos próximos dias, um grupo de trabalho formado por 20 deputados

Depois que a Câmara aprovou regime de urgência para o projeto que prevê liberar atividades econômicas, como a extração de minério, nas reservas indígenas, nos próximos dias, um grupo de trabalho formado por 20 deputados — 13 da base governista e 7 da oposição — irá avaliar os pontos negativos e positivos do texto. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), favorável à aprovação, admitiu que o texto deve sofrer alterações.

Entusiastas do texto apresentam como argumento principal a favor do projeto é que o texto irá regulamentar uma atividade que já ocorre clandestinamente dentro das reservas indígenas, e por isso, só tem contribuído para fortalecer o crime organizado que a sustenta.

O Projeto de Lei 191/20 regulamenta a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em reservas indígenas. A iniciativa do governo federal vai ao encontro de declarações do presidente Jair Bolsonaro, que desde a posse defende o aproveitamento econômico de territórios indígenas.

ARGUMENTOS FAVORÁVEIS À PROPOSTA

“Em Roraima, tem R$ 3 trilhões embaixo da terra. E o índio tem o direito de explorar isso de forma racional, obviamente. O índio não pode continuar sendo pobre em cima de terra rica”, disse Bolsonaro, em abril de 2019, ao encontrar representantes das etnias Parecis (Mato Grosso), Macuxi (Roraima), Xucuru (Pernambuco) e Yanomamis (Amazonas/Roraima), que reivindicam o direito de explorar as reservas tradicionais.

Mineração em terras indígenas: a proposta do governo Bolsonaro em 10 perguntas e respostas - ((o))eco
Área de garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Munduruku, no Pará. Foto: Vinícius Mendonça/Ibama.

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De acordo com a Constituição Federal, essas atividades só podem ser realizadas em solo indígena com prévia autorização do Congresso Nacional, por meio de decreto legislativo, e mediante consulta às comunidades afetadas, as quais é assegurada participação nos resultados.

Além das imposições constitucionais, o texto do Executivo determina que a exploração econômica do subsolo indígena deverá assegurar indenização às comunidades afetadas, já que a atividade impede que eles explorem a própria terra (restrição ao usufruto). O cálculo da indenização levará em conta o grau de restrição imposto pelo empreendimento.

ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À PROPOSTA

No extremo oposto, a oposição vê no conteúdo do projeto, que tem apenas 16 páginas, um “libera geral” para a atuação de criminosos em terras indígenas, o que seria irreversível para a proteção da Amazônia.

Foto: Lucas Hallel ASCOM/FUNA”

Uma área na Amazônia quase do tamanho da Venezuela pode ser devastada, resultando em prejuízos econômicos bilionários por ano, caso um projeto de lei que autoriza mineração dentro de terras indígenas no Brasil seja aprovado. É o que concluiu um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e australianos que analisou os impactos ambientais do PL 191/2020, apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional em fevereiro deste ano. Hoje uma prática ilegal, a exploração mineral nessas áreas protegidas, que abrigam a maior porção de floresta intocada do bioma, passaria a ser possível.

“Se todas as ocorrências minerais que conhecemos hoje fossem desenvolvidas, tanto dentro como fora das terras indígenas, o impacto chegaria a 863 mil km²”, calcula o professor Britaldo Soares-Filho, coordenador do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e um dos autores do estudo,  publicado neste mês na revista científica One Earth.

Caso o projeto de lei seja rechaçado, a área máxima afetada pela mineração na Amazônia brasileira seria de 700 km², um número 23% menor, mas ainda assim uma extensão equivalente ao dobro do território da Alemanha, aponta a pesquisa.

Essa porção de floresta afetada seria substituída não apenas pelas cavas das minas e por suas usinas de beneficiamento, mas também por estradas, linhas de energia e infraestrutura de serviços ligados à atividade. A perda de biodiversidade vinculada aos projetos de mineração afetaria cadeias produtivas locais, como a da madeira e a da borracha, além da extração de castanha-do-pará, que garante a subsistência de muitos povos da floresta.

O desmatamento de uma área com essas dimensões traria ainda alterações no regime de chuvas – não apenas da Amazônia, mas do Centro-Oeste e até do Sul, regiões onde está concentrado o agronegócio do país, responsável por 21% do PIB nacional, segundo a Confederação Nacional de Agricultura. O estudo aponta ainda que, sem chuva, as lavouras perderiam produtividade.

Na ponta do lápis, o resultado seria uma prejuízo total de ao menos 5 bilhões de dólares por ano (cerca de R$ 28 bilhões na cotação atual), o equivalente ao lucro líquido de um dos maiores bancos do país em 2019. Trata-se de uma estimativa do valor que a área de floresta  potencialmente afetada pela mineração fornece à economia global, ao produzir alimentos, mitigar as emissões de CO2 e regular o clima para a agricultura e a produção de energia.

“E esse é um valor extremamente conservador, porque conseguimos medir apenas alguns serviços ecossistêmicos. Financeiramente, há muito a se perder com o desmatamento”, alerta Soares-Filho.

O cálculo foi feito considerando os danos ambientais na vegetação e em rios em um raio de 70 quilômetros a partir do local de extração do minério e inclui desmatamento e degradação da floresta.

Fonte: Outras Palavras

“Este estudo está baseado em outros dois artigos prévios, publicados na Nature, nos quais medimos a extensão do impacto da mineração, sobretudo o indireto, e chegamos a essa área”, explica o professor da UFMG.

O novo estudo alerta ainda para a pressão populacional decorrente de uma eventual liberação da mineração em terras indígenas, cuja consequência imediata seria uma ameaça aos povos e aos ecossistemas presentes na floresta, muitos ainda nem conhecidos por cientistas.

Apenas na Amazônia Legal vivem 222 etnias, e há 332 terras indígenas oficiais e 92 em estudo, com 655 mil famílias que falam 160 línguas. E tudo isso está ameaçado com o PL 191/2020.

“O prejuízo cultural é muito difícil de ser calculado”, afirma Juliana Siqueira-Gay, doutoranda e pesquisadora da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), que também assina o artigo publicado na One Earth.

FONTES: Câmara Federal / DW / O Globo 

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Lucas Monteiro

Engenheiro Florestal com especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho e em Perícia e Auditoria ambiental . Formação de Auditor nos sistemas ISO 9001, ISO 14001 e ISO 45001 e FSC® (FM/COC). Experiência em Due Diligence Florestal, mitigação de riscos ambientais e Cadeia de suprimentos da Madeira para mercados internacionais (EUDR e Lacey Act).

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