Araucárias surgiram há 200 milhões de anos e sua distribuição foi influenciada por clima e ação humana

A Araucaria angustifolia, conhecida como pinheiro-do-paraná ou pinheiro-brasileiro, é a principal espécie da Mata de Araucária. Encontrada no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, e de forma mais esparsa em São Paulo e Minas Gerais, acredita-se que ela tenha surgido há 200 milhões de anos, no período Jurássico.

Araucárias surgiram há 200 milhões de anos e sua distribuição foi influenciada por clima e ação humana
Por Germano Roberto Schüür – Obra do próprio, CC BY-SA 3.0.

Há hipóteses de que a Floresta de Araucárias no sul do Brasil tenha passado por expansões no passado, impulsionadas por grupos humanos ou por flutuações climáticas do Holoceno e do Pleistoceno. Registros de pólen fóssil do pinheiro-do-paraná fornecem algumas pistas sobre quando essas expansões podem ter ocorrido, mas o momento exato nunca havia sido estimado.

Uma pesquisa liderada pela bióloga Mariana Vasconcellos, do Instituto de Biociências (IB) da USP, encontrou evidências sobre o período em que essa disseminação aconteceu. Utilizando sequenciamento reduzido de DNA (ddRADseq), aprendizado de máquina e dados de um banco abrangente de registros de pólen fóssil, foi realizado um estudo de inferência demográfica histórica e modelagem da distribuição antiga da árvore.

Os resultados indicam que a expansão da A. angustifolia é bem mais antiga do que se imaginava. No Sul do Brasil, ela teria ocorrido há cerca de 70 mil anos, antes da ocupação humana. Já na Serra da Mantiqueira, esse processo aconteceu mais recentemente, por volta de três mil anos.

“As mudanças climáticas, com aumento na frequência e intensidade das incursões polares e precipitação extratropical no Sul do Brasil, provavelmente promoveram a expansão precoce dessas árvores adaptadas ao frio no Sul, mas não na Serra da Mantiqueira, mais ao Norte”, escrevem os pesquisadores no artigo. Eles sugerem que “a expansão muito mais recente identificada na população de árvores da Mantiqueira pode ser o resultado de mudanças climáticas do Holoceno e/ou do impacto humano, embora as evidências arqueológicas para este último sejam muito escassas”.

Modelagem

“Mariana Vasconcellos explica: ‘Pesquisamos 64 tipos diferentes de estudos em várias localidades, analisando amostras de solo para identificar onde e quando encontraram pólen de araucária, com base nas datações do estudo. Utilizando os dados atuais de distribuição da árvore, desenvolvemos modelos correlacionais dos pontos de presença com variáveis climáticas, o que nos permitiu estimar sua distribuição e projetá-la no passado.’

Durante a última era glacial, há cerca de 21 mil anos, a espécie estava mais amplamente distribuída, sendo que hoje vemos apenas vestígios de uma floresta que já foi mais extensa. Isso sugere que a presença humana pode ter favorecido a permanência da floresta em sua localização atual. ‘Não encontramos evidências genéticas de contração ou redução populacional da árvore, pois isso pode não ter ocorrido. As condições climáticas para a existência da floresta é que foram se tornando mais restritas. Entretanto, as populações humanas que ali habitavam e promoviam o plantio podem ter aumentado a abundância dessas árvores localmente.’

Para investigar mais a fundo esse cenário, os pesquisadores realizaram o sequenciamento genético da árvore. ‘Utilizamos métodos de sequenciamento reduzido do genoma, sequenciando partes aleatórias em vez do genoma completo, o que nos permitiu detectar assinaturas de expansão ou retração populacional.’

A comparação entre os dois grandes agrupamentos genéticos – região Sul e Serra da Mantiqueira – revelou diferenças significativas em suas assinaturas genéticas. Notavelmente, foi observada uma baixa distância genética entre localidades distantes no Sul do Brasil, contradizendo o modelo de isolamento por distância, que é comum em populações naturais. No entanto, esse modelo foi encontrado na Serra da Mantiqueira.

Na região Sul, foi identificado um alto nível de fluxo gênico, ou seja, movimento de genes entre as populações, e uma alta endogamia, padrão genético que ocorre quando indivíduos muito relacionados geram descendentes.

Essa falta de padrão de isolamento por distância fortaleceu a hipótese de influência humana no Sul. ‘Acreditamos que esse seja um efeito presente nas populações onde os humanos estariam promovendo tanto a dispersão de sementes quanto a germinação, resultando em uma maior abundância de indivíduos geneticamente relacionados. Esse efeito parece ter sido mais pronunciado na floresta do Sul do Brasil do que na Mantiqueira’, relata Mariana ao Jornal da USP.

Embora o solo da região não mostre sinais evidentes de manejo humano, os cientistas encontraram uma grande quantidade de pólen de araucária durante as perfurações, e como essa é a única espécie desse gênero no país, sua identificação foi facilitada pelas características únicas do pólen.”

Consumo do pinhão

Registros de pólen fóssil foram descobertos próximos a sítios arqueológicos onde árvores contemporâneas estão enraizadas, corroborando a hipótese de que a disseminação dessas sementes coincidiu com os movimentos migratórios de antigas populações.

O que são as araucárias que produzem pinhão de forma precoce?

A tradição de consumir o pinhão, a semente da araucária, remonta às primeiras comunidades indígenas que habitavam a região Sul do país há pelo menos quatro mil anos. A alta concentração de pólen nos registros fósseis pode ser atribuída a essa influência humana, que estimulou a germinação das sementes e promoveu a proliferação da espécie na região. Além disso, os especialistas sugerem que o aumento significativo das chuvas durante o Holoceno, que começou há 11 mil anos e continua até hoje, pode ter facilitado a expansão da floresta em direção ao Norte, na Serra da Mantiqueira.

Essa interação entre humanos e araucárias pode não ter sido intencional, mas contribuiu para a dispersão das sementes e para o fluxo gênico. As sementes de araucária têm uma capacidade de germinação bastante elevada, como demonstrado por um experimento realizado no Jardim Botânico de Nova York, onde sementes de A. angustifolia germinaram simplesmente ao serem colocadas em solo úmido, sem a necessidade de plantio. Isso sugere que a espécie pode ter se beneficiado do aumento do consumo de pinhão, o que resultou em uma maior disseminação das sementes, ou de práticas de manejo da terra.

A Araucaria angustifolia é uma espécie de longa vida e não há evidências de um padrão de contração populacional com base no genoma das plantas. No entanto, acredita-se que as gerações futuras possam sentir mais os efeitos da redução populacional atual, devido à maior endogamia. “A redução populacional é preocupante para qualquer espécie, pois diminui o seu potencial adaptativo para lidar com as mudanças climáticas futuras. Prevemos que eventos climáticos extremos se tornarão mais frequentes no futuro, e populações com maior diversidade genética terão mais recursos para enfrentar essas mudanças, enquanto aquelas com baixa diversidade genética correm maior risco de sofrer impactos negativos”, alerta Mariana Vasconcellos.

Fonte: Jornal da USP


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Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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