Enquanto delegações do mundo inteiro negociam, em Belém, caminhos para acelerar a transição energética, a Agência Internacional de Energia (AIE) divulgou nesta quarta-feira (12) um relatório que esfriou os ânimos dos mais otimistas. O documento projeta que a demanda por petróleo continuará crescendo nas próximas décadas e que o planeta pode caminhar para um aumento de temperatura muito acima das metas definidas pelo Acordo de Paris.

Segundo o diretor-executivo da AIE, Fatih Birol, o ritmo atual da transição energética está longe do necessário para frear a crise climática.
“Os sinais de avanço não estão acompanhando a velocidade exigida pelo clima.”
Mesmo com investimentos crescentes em renováveis, Birol alerta que a combinação entre expansão econômica global, políticas públicas insuficientes e pressões de segurança energética ainda mantém petróleo e gás no centro da matriz mundial.
Demanda em alta: 113 milhões de barris por dia em 2050
O relatório prevê que, mantidas as políticas atuais, a demanda por petróleo deve atingir 113 milhões de barris por dia em 2050, um aumento de 13% em relação a 2024. A expansão seria puxada sobretudo por economias emergentes, onde o consumo energético cresce junto com a urbanização e a industrialização.
A projeção marca uma mudança importante dentro da própria AIE, que em relatórios anteriores previa um pico da produção antes de 2035. Agora, o auge só ocorreria caso países adotem políticas climáticas muito mais rigorosas — o que ainda não está no horizonte.
A posição da agência foi imediatamente comemorada pela Opep, que descreveu o relatório como um “retorno à realidade”, após anos criticando o que considerava projeções excessivamente otimistas sobre o fim dos combustíveis fósseis.
África trava negociações da Meta Global de Adaptação na COP30 e pressiona prioridade do Brasil
COP30: cenário político complicado para discutir “transição para fora dos fósseis”
No contexto da COP30, a divulgação do relatório adiciona tensão às discussões. O Brasil, como anfitrião, pretende avançar nos critérios para operacionalizar a decisão da COP28, em Dubai, que estabeleceu a transição para fora dos combustíveis fósseis.
Mas dois fatores limitam o avanço:
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A ausência dos Estados Unidos, maiores produtores de petróleo do mundo.
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A resistência de delegações africanas, que argumentam que a transição não pode desconsiderar desigualdades históricas, falta de acesso à energia e necessidades de desenvolvimento.
Nesse cenário, o novo relatório serve tanto de alerta quanto de munição para países produtores de petróleo que defendem uma transição mais lenta.
Inteligência artificial, segurança energética e o peso das novas tecnologias
A AIE também destaca que tendências recentes reforçam a dependência global de energia fóssil. A preocupação com segurança energética, a pressão por crescimento econômico e o avanço de tecnologias intensivas em energia — como inteligência artificial, computação em nuvem e data centers — tornam o processo de transição mais lento.
Além disso, a agência reforça argumentos usados pela própria indústria nos últimos anos: a necessidade de ampliar a oferta energética para populações que ainda não têm acesso confiável à eletricidade, especialmente na África e no sul global.
2,5°C a 3°C: a rota atual empurra o planeta para aquecimento extremo
O relatório apresenta três cenários centrais:
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Políticas atuais: aquecimento de cerca de 3°C até 2100.
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Políticas anunciadas, mas não implementadas: ~2,5°C.
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Neutralidade climática até 2050: mesmo assim, o limite de 1,5°C seria temporariamente ultrapassado nas próximas décadas, com retorno apenas depois de 2100 — e dependente de tecnologias de remoção de carbono em larga escala, que ainda não existem.
A conclusão é dura:
“A janela para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C está se fechando rapidamente.”
Sem políticas mais robustas e investimentos massivos em energia limpa, o mundo corre o risco de manter-se preso a uma matriz de alto carbono por mais uma geração.
O enredo político: Opep celebra, ativistas alertam
A Opep, que reúne os principais exportadores de petróleo do mundo, celebrou publicamente o que chama de mudança de postura da AIE. Em nota, a organização afirmou que o relatório reconhece que petróleo e gás continuarão centrais na economia global por décadas — percepção alinhada aos interesses do grupo.
Ativistas e especialistas em clima, por outro lado, veem o cenário com preocupação. A continuidade da expansão dos combustíveis fósseis coloca em risco:
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metas climáticas internacionais,
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a segurança global,
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a resiliência de populações vulneráveis,
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e o próprio legado da COP30, que busca fortalecer compromissos de adaptação e mitigação.
O que esperar daqui para frente?
O relatório da AIE chega em um momento delicado e tem potencial para influenciar diretamente:
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as negociações sobre a transição energética,
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os debates sobre financiamento climático,
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e a discussão sobre responsabilidade histórica e justiça climática.
Enquanto os líderes globais discutem em Belém o futuro da matriz energética mundial, o novo diagnóstico traz um recado claro: sem políticas muito mais ambiciosas, o mundo seguirá dependente do petróleo — e cada vez mais distante das metas climáticas.
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