40% da região amazônica está sob algum manejo de conservação

Uma equipe de pesquisadores revelou que mais de 40% das terras na Pan-Amazônia — uma área que abrange nove países — estão sob algum tipo de manejo de conservação, superando significativamente os 28% registrados oficialmente. Esse percentual inclui todos os ecossistemas da região, sendo que só na Floresta Amazônica, 62,44% das terras estão classificadas como áreas de conservação.

Rio Pipini, na Amazônia peruana. Foto: Rhett A. Butler/Mongabay

Para alcançar esses números, os pesquisadores foram além das áreas protegidas tradicionais, como parques nacionais e reservas ambientais. Eles reuniram dados de artigos científicos, documentos legais e conhecimentos locais, considerando também terras manejadas por povos indígenas, áreas de manejo de recursos naturais mantidas por comunidades locais, regiões cobertas por programas de pagamento por serviços ecossistêmicos e áreas de produção florestal sustentável.

Segundo os pesquisadores, essa abordagem oferece uma visão mais completa das iniciativas de conservação do que os sistemas de rastreamento atuais, além de auxiliar na avaliação da eficácia de diferentes modelos de governança em conservação.

“Saber quem está gerindo essas áreas e como, além de reconhecer sua contribuição para a conservação, é o primeiro passo para planejar coletivamente um futuro justo e sustentável para nosso planeta”, afirma Siyu Qin, autora principal do estudo.

No mapa acima, a área abarcada no estudo e os tipos de manejo detectados. Imagem: Qin et al 2024

O estudo destaca o papel crucial dos povos indígenas e comunidades locais na conservação. Os territórios indígenas representam 16% da área total da Pan-Amazônia, enquanto as áreas de conservação administradas por comunidades locais somam outros 3,5%. As reservas indígenas, em especial onde as comunidades garantiram direitos consolidados à terra, geram significativos benefícios de conservação.

Áreas de uso sustentável e florestas comunitárias também ocupam porções significativas da região. Embora nem todas sejam geridas estritamente para a conservação, os autores reconhecem sua importância na manutenção de serviços ecossistêmicos e modos de vida sustentáveis.

Globalmente, o estudo estima que 45% ou mais das terras pertencem tradicionalmente a povos indígenas e comunidades locais, embora nem todas estejam formalmente reconhecidas ou tenham a conservação como principal objetivo.

Os territórios indígenas na Amazônia enfrentam diversas ameaças crescentes, incluindo exploração ilegal de madeira, mineração e expansão agrícola. A falta de reconhecimento legal dos direitos à terra dificulta a defesa desses territórios contra pressões externas.

Women from the Sinangoe Indigenous Guard. Alexandra Narváez, third from left, led the creation of the Indigenous Guard in 2017, and was the only woman in the group at the time.
Mulheres da Brigada Indígena Sinangoe, na Amazônia equatoriana. Alexandra Narváez, terceira a partir da esquerda, liderou a criação da brigada em 2017. Sua comunidade conseguiu uma grande vitória legal, impedindo a mineração em 52 concessões florestais. Imagem cedida pelo Goldman Environmental Prize.

“Se a floresta ainda está de pé, é graças à presença dos povos indígenas. Hoje, essa é a missão mais importante para o nosso planeta, uma missão que garante não só nossas vidas, mas a vida de todos”, declara a ativista Txai Suruí, do povo Paiter Suruí e coordenadora do movimento da juventude indígena de Rondônia.

Segundo um relatório de 2023 do Projeto Monitoramento da Amazônia Andina (MAAP), os territórios indígenas na Floresta Amazônica sofreram apenas um terço da perda de floresta primária em comparação com áreas não protegidas.

“Empoderar comunidades historicamente marginalizadas e garantir seu papel como protetores da natureza é fundamental em áreas onde faltam serviços públicos”, afirma Vilisa Morón Zambrano, bióloga da Universidade Simón Bolívar, na Venezuela, e coautora do estudo. Ela explica que isso permite que essas comunidades demonstrem sua importância na proteção da natureza e dos serviços ambientais além de seus territórios.

Brooke Williams, pesquisadora e fellow da Universidade de Tecnologia de Queensland, na Austrália, que não participou do estudo, destacou a importância de identificar e classificar corretamente os diferentes tipos de esforços de conservação. Ela observa que todas as medidas de conservação devem proporcionar benefícios duradouros à biodiversidade para cumprir as metas globais.

Qin destaca que, em mais de 30% das áreas sob manejo de conservação, a Floresta Amazônica ainda está ameaçada por desmatamento e incêndios. As mudanças climáticas agravam esses problemas, alterando padrões de chuva e aumentando a frequência de secas e incêndios que se espalham das áreas agrícolas para a floresta.

Cientistas alertam que a Amazônia está se aproximando do ponto de não-retorno, onde começaria a se transformar em uma savana seca e degradada.

Brazilian National Indigenous Mobilization 2018
Mais de 3 mil indígenas de cem povos diferentes marcharam em frente à Esplanada dos Ministérios em 2018 pedindo ao governo federal a demarcação das Terras Indígenas. Foto: 350.org via Flickr (CC BY-NC-SA 2.0).

Diante dessas ameaças, Qin questiona se a meta global de “30×30” (proteger 30% das terras e águas do planeta até 2030) é suficiente, especialmente para ecossistemas tão importantes quanto a Amazônia. Alguns especialistas defendem proteções ainda maiores para a maior floresta tropical do mundo.

“Na verdade, proteger 30% das terras não é uma meta ambiciosa, pois se considerarmos as áreas protegidas existentes e os territórios indígenas onde a biodiversidade é preservada e o uso é sustentável, o número global já ultrapassa os 30%”, afirma a Avaaz, organização não governamental de ativismo.

Em abril, centenas de organizações endossaram uma declaração pela proteção de 80% da Amazônia até 2050.

“Nossos dados mostram que proteger 80% da Amazônia é necessário e possível, mas, acima de tudo, urgente. Se a atual tendência de desmatamento continuar, a Amazônia como conhecemos hoje não chegará a 2025”, aponta um relatório de 2022, baseado em dados de desmatamento de 1985 a 2020.

As taxas de desmatamento ilegal no Brasil caíram no último ano, desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se comprometeu a conter a perda de florestas no Brasil. No entanto, os incêndios continuam em alta.

Cattle in a deforested patch of Amazon rainforest. Photo by Rhett A. Butler for Mongabay.
Gado em trecho da Floresta Amazônica. A pecuária é um dos principais motivadores do desmatamento na Amazônia. Foto: Rhett A. Butler/Mongabay

Clara L. Matallana-Tobón, coautora do estudo, ressalta que, apesar das diversas estratégias de conservação na Amazônia, muitas precisam ser fortalecidas em termos de governança, monitoramento e financiamento.

Para fortalecer as áreas já destinadas à conservação, especialistas sugerem melhorias na governança, no monitoramento da biodiversidade, no aumento de financiamento e na base das decisões de manejo em pesquisas sólidas. Há também uma forte ênfase em ampliar o envolvimento das comunidades locais nos esforços de conservação, pois sua participação pode aumentar consideravelmente a eficácia desses esforços.

O financiamento para proteger a natureza deve se destinar não só a parques e reservas, mas também a diferentes tipos de áreas de conservação, especialmente aquelas onde os moradores locais estão envolvidos, defendem os autores do estudo.

Cada área de conservação tem seus desafios específicos e pode necessitar de estratégias particulares para seu fortalecimento. O objetivo é criar áreas protegidas bem geridas que possam resistir melhor às pressões ambientais e preservar efetivamente a biodiversidade a longo prazo.

“Esperamos que este inventário sirva como ponto de partida para o planejamento dos esforços de conservação”, afirma Yifan He, uma das principais autoras do estudo, da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara (EUA). “Antes de decidir onde criar novas áreas de conservação ou como priorizar recursos limitados, precisamos primeiro entender o que já existe e como essas áreas são geridas.”

Fonte: Mongabay


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Arthur Brasil

Engenheiro Florestal formado pela FAEF. Especialista em Adequação Ambiental de Propriedades Rurais. Contribuo para o Florestal Brasil desde o inicio junto ao Lucas Monteiro e Reure Macena. Produzo conteúdo em diferentes níveis.

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